O mundo serial da TV
Clotilde Tavares | 21 de maio de 2009Sou uma série-maníaca compulsiva. Isso quer dizer que acompanho com entusiasmo muitas das séries que passam na TV fechada. Gosto sobretudo dos enredos policiais, de detetives, e daqueles que envolvem perícia médica, um ramo da medicina que sempre me atraiu muito. E também gosto de séries cômicas e românticas.
Só para você ter uma idéia, acompanho com fervor: E.R. – cuja última temporada começa agora em junho revelando no primeiro episódio quem morreu na explosão da ambulância), Desperate Housewives, C.S.I. Las Vegas, Miami e New York, The Big Bang Theory, Two and a Half Men, Life, The Mentalist, Fringe, The Eleventh Hour e In Plain Sight. E já acompanhei:
Gilmore Girls, Friends, Without a Trace, Sex and the City, Close to Home, Medium, Vegas, Bones, Justiça Sem Limites, Criminal Minds e muitas que esqueci o título, séries que já acabaram ou – pior – começaram a ser dubladas, como as do canal Fox, tornando insuportável a audição. E teve ainda Heroes, Law and Order-SVU, Huff e House, que eram do Canal USA que tive até 2007 e agora não tenho mais.
Vale a pena também lançar um olhar nostálgico sobre o passado, sobre a era pré TV-a-Cabo, ainda na TV preto-e-branco e me lembro logo de Napoleon Solo – o Agente da UNCLE,
MacGyver-Profissão Perigo, O Fugitivo, O Incrível Hulk, Bonanza, Dr. Kildare, Dallas, A Feiticeira, Jeanie é um Gênio, Perdidos no Espaço, Casal 20, Ilha da Fantasia, As Panteras… Não são todas, são apenas algumas das que eu vi e que me lembro.
Gosto das séries que assisto por motivos variados. E.R. me traz de volta os três ou quatro anos em que, ainda estudante, dava plantões nos Pronto-Socorros do Hospital das Clínicas da UFRN e do INPS (antigo Hospital dos Pescadores, nas Rocas) em Natal, serviços de urgência já extintos, onde aprendi muita coisa e vivi muita coisa rica de experiência humana. Os acontecidos ali, onde eu às vezes passava tres ou quatro noites por semana de plantão, davam pra fazer 15 temporadas de 20 episódios cada uma. Para mim, a prática da urgência é a mais interessante da Medicina, e se eu voltasse, era onde gostaria de trabalhar: num serviço de atendimento de urgência.
The Big Bang Theory é uma série sobre quatro jovens pHDs, inteligentíssimos mas completamente inábeis quando o negócio é lidar com as questões práticas da vida, em especial os relacionamentos amorosos. Lembro da minha tímida e desajeitada adolescência, lendo tudo o que é de livro, sabendo desenvolver equações e matrizes, mas cheia de dedos quando era pra namorar. Os atores são ótimos, e a loirinha Penny (Kaley Cuoco), egressa de outro seriado, Charmed, é realmente muito fofa. É uma série de meia-hora, que segue o modelo de Friends e Two and a
Half Men, com roteiro ágil, piadas engraçadas, inteligentes e bem encadeadas. Aliás, em Two and a Half Men há uma das melhores personagens do mundo serial da TV: a empregada Berta.
Uma das novidades deste ano são as séries Fringe e The Eleventh Hour, que se propõem a tratar de temas ligados à ciência e à tecnologia, com fortes dosagens de ficção científica, principalmente em Fringe. Esta série começou muito bem, mas eu não gostei dos últimos episódios, que para mim perderam um pouco a qualidade, com soluções saindo do nada e situações que ferem a verossimilhança interna do enredo, tendo se recuperado no episódio desta semana, aquele onde
a agente do FBI Olivia Dunham (Anna Torv) é raptada. The Eleventh Hour, cujo protagonista é o Rufus Sewell, ator meio canastrão mas que eu simplesme a-do-ro, não consegue decolar, os episódios são mornos e ainda não conseguiram me convencer.
Quanto a The Mentalist, ver durante uma hora o lindíssimo Simon Baker no papel-título contribui para a recuperação dos meus olhos esturricados de passar 16 horas por dia diante de uma tela. Na verdade, o moço é um verdadeiro colírio que recomendo enfaticamente “a todos e todas” que gostarem de ver homem bonito. As tramas é que precisam ser um pouco mais bem amarradas para amarrar também o espectador mas quer saber? Com Simon Baker na tela, eu nem ligo.
Já Desperate Housewives continua simplesmente maravilhosa, com suas doses cavalares de humor negro, as vezes mais humor, às vezes mais negro, mas sempre uma diversao garantida. Gosto de brincar comigo mesma de “qual é a minha desperate favorita”, e escolho naquela semana uma delas para observar melhor, e procurar gente parecida com ela entre as pessoas que conheço: a controladora Lynette, a fútil Gabrielle, a piranhésima Eddie, a desastrada Susan, a perfeccionista Bree ou a sonsa Katherine. As crianças – os filhos de Lynette, as filhas gordinhas de Gaby, os filhos de Bree, Mike Jr. – são um show e a velha senhora MacCluskey é, como Berta de Two and a Half Men, um presente dos céus para qualquer atriz.
Vejam o diálogo de ontem, quarta feira, episodio 16 da 5a. temporada.
Gabrielle (G) vai encontrar a amante (A) do marido da amiga para convencê-la a desistir do caso.
G – Você precisa acabar esse caso. Ele é casado.
A – É, eu, sei, mas ele não ama a esposa.
G – Ama, sim, ama muito, eles têm dois filhos.
A – Ele me disse que vai se separar.
G – Separar como? Ela está grávida.
A – É mentira. Ele me garantiu que não transa com ela há mais de um ano.
G – Então temos que ligar para o Vaticano pois vamos precisar de uma manjedoura…
Concorde comigo, meu caro leitor, que é uma verdadeira diversão.
Antes que você me pergunte, eu não acompanho nem Lost, nem Grey’s Anatomy. Não vejo Lost porque me dá agonia aquele povo sujo, suado, com os cabelos nos olhos; e Grey’s Anatomy porque não consegui me envolver nem com o roteiro nem com os personagens – e talvez porque quando estudei Anatomia semore preferi o livro de Gardner ao de Grey.
Uma coisa boa das séries é que não há perigo de perder um episódio. Boa parte delas têm episódios independentes, e não faz muita diferença você ficar sem ver um ou outro. Além disso, os canais oferecem cinco ou seis oportunidades de ver o mesmo episódio na semana; e nos períodos entre uma e outra temporada nova, os capítulos passam todos novamente. É bem diferente de assistir à novela das oito, onde você só tem aquela oportunidade para ver o capítulo, o que lhe faz ficar prisioneiro da história e da emissora.
Agora eu quero fazer um comentário de outro tipo e, se você chegou até aqui e está cansado de ler, levante-se, beba um copo dágua – é muito bom beber água, e a cota é dois litros por dia – e volte depois.
Imaginem vocês que chegou aqui em casa uma pessoa conhecida no auge das temporadas dos C.S.Is. e ficou reclamando de mim. Disse que eu passava o meu tempo vendo essas séries cheias de crimes, de roubos, de assassinatos, de violência e que isso não era legal pra mim. Além disso, o tempo gasto dessa forma na frente da TV me impedia de ler um jornal, de ver o noticiário, de me inteirar do que estava acontecendo no país.
Pensei um pouco e concordei. Na noite seguinte, em vez de assistir à minha série preferida, liguei a TV no Jornal Nacional. Foram crimes, assassinatos, extorsão, corrupção ativa e passiva, crimes de ódio, tiroteios, tráfico de armas e drogas, abuso sexual, exploração e prostituição de menores, pedofilia, e todo tipo de desgraça que você possa imaginar! E tudo de verdade. Tudo acontecendo de verdade com gente de carne e osso que nem eu e você.
Voltei para as minhas séries porque nelas os ladrões e criminosos vão todos para a cadeia. Já os que vi no Jornal Nacional, de paletó e uma gravata, transitam para lá e para cá, de Brasília para o exterior, da capital para o interior, com passagens e salários pagos do meu e do seu bolso, e estão todos aí posando de “homens bons” no Congresso, nos Tribunais Superiores, nas presidências das estatais.
Deixem-me de volta com meus personagens preferidos, com minhas donas-de-casa desesperadas, com os nerds incapazes de namorar, com os irmãos Charlie e Alan Harper, com Berta e a Sra. MacCluskey, com o Detetive Crew, com o lindíssimo Patrick Jane, com a louraça Mary Shannon, com as Dras. Abby Lockhart e Neela Rasgotra.
Alienada! você diz. Omissa! você afirma. Irresponsável! você quase grita. E eu respondo: sou mesmo! E ligo a TV.