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A fala dos bichos

Clotilde Tavares | 30 de junho de 2009

beija_f1aaO beija-flor, suspenso no ar diante dos hibiscos do quintal, arrulha. A ovelha, paciente e terna, bale. O pardal inquieto chilreia. O peru, majestoso e solene como um juiz togado, gorgoleja. O canário, em súbita aparição nas frondes do coqueiro, trina, mas o encanto dura pouco e ele desaparece no azul. A cobra silva e logo se esconde, deslizando sua serpeante anatomia por entre pedras e arbustos. O sagui, reclamando suas bananas de todo dia, chia. A mosca zumbe, impedindo o sono matinal.

onçaA onça, nos grotões esquecidos, esturra. O lobo uiva, em qualquer filme de vampiro. O jumento, excitado e descomunal, orneja. O cachorro ladra, late, gane, rosna, acua e uiva imitando o lobo. O cavalo relincha e nitre, entre nuvens de suor, levantando as patas no ar. O cabrito berra. Ou melhor: o mau, porque o bom cabrito fica caladinho de tão sonso. A andorinha gorjeia em revoada fazendo o verão, como num samba antigo. O corvo crocita seu eterno nunca mais, e prenuncia desgraças. O ganso grasna e grita, espantando os intrusos. O sapo coaxa, mora na beira da lagoa e não lava o pé porque não quer. O porco grunhe, ronca, guincha e se revolve na lama quente e macia, enquanto acumula delícias em sua carne suculenta.

elefanteO elefante barre. A galinha cacareja, cacareja, cacareja e o galo canta e clarina enquanto os pintainhos piam, desesperados e carentes. A abelha zune, zumbe, zunzuna, zonzoneia e zoa, tudo com “z”, somente para fazer mel. O bode bodeja, arrastando sua imponência de pai-de-chiqueiro atrás de cabras e cabritas, que berram e balem, mas ficam para ver qual é a proposta.

cegonhaA cegonha eu nunca vi, mas dizem que glotera. O morcego trissa e farfalha, em vôos rasantes e sonarizados, desafiando os obstáculos. O papagaio parla e protagoniza anedotas. A cigarra canta, chia, cigarreia, estridula e retine, a zombar da muda e estúpida formiga que, muda como o peixe,  trabalha sem parar. O gavião guincha, com as garras famintas de preás rechonchudos. O touro muge, tuge e brame. A vaca, com seus olhos doces e suaves, também muge, mas noutro tom. O grilo tritrila e estridula quando a noite cai.

E o gato? O gato ronrona, mia, resmoneia, rosna e reina sobre a casa, da qual é dono e senhor.

Everaldo, que uma noite sumiu e nunca mais voltou.

Everaldo, que uma noite sumiu e nunca mais voltou.

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Procurando apartamento para alugar

Clotilde Tavares | 29 de junho de 2009
Natal, cidade impossível.

Natal, cidade impossível.

Estou procurando apartamento para alugar. Para os seguidores deste blog que não me conhecem, o apartamento que procuro é em Natal, capital do Rio Grande do Norte, uma cidade linda, perfumada, agradável, cidade onde morei durante 35 anos e da qual estou ausente há quatro, morando na capital parahybana a 180 km de distância. Eu gosto de definir Natal dizendo que ela é uma cidade impossível, como aquelas cidades do livro de Ítalo Calvino, porque Natal encerra tantas contradições, tantas coisas boas ao lado das piores, tudo tão entrelaçado e misturado que muitas vezes corta todas as nossas possibilidades de se viver nela. Mas meu tempo na Parahyba acabou. A saudade dos filhos e netos vem aumentando e agora estou de volta: é isso que importa.

As caixinhas, e a "moça com brinco de pérola".

As caixinhas, e a "moça com brinco de pérola".

A experiência de procurar apartamento em qualquer cidade é algo quase transcendental, pelo muito que envolve, pelas energias mobilizadas, pela ansiedade, pelo quadro em branco que é um apartamento onde não moramos ainda e que queremos encontrar, que só existe na nossa mente, espaço desejado e ainda não encontrado, dentro do qual precisamos inscrever mesmo que somente na imaginação os locais para o sofá, os livros, a mesinha preferida, as cortinas, a coleção de caixinhas, a posição da cama, os quadros, as fotografias.

Será que cabe?

Será que cabe?

Aí, entramos naquela habitação vazia, nua, asséptica, recém-pintada, e começamos a pensar: será que meu sofá cabe nessa parede? Será que quando estiver sentada aqui vou gostar de ver sempre essa porta da cozinha que abre direto na sala? Esse corredor estreito não vai me dar claustrofobia e me fazer rememorar o trauma do parto toda vez que eu passar por ele? Essa pia da cozinha tão alta não vai me deixar com dor nas costas? Será que tem barulho? Debruço na janela do quarto e vejo bem em frente aquela estrutura colorida de madeira na qual as crianças adoram subir e descer sem parar. Não, este positivamente não é o apartamento que quero.

Apartamento-colméia

Apartamento-colméia

Tenho andado bastante nesses dias. E tenho encontrado – com algumas exceções – apartamentos de dois tipos. O primeiro tipo é o que chamo “colméia”. Apartamentos de 55 m2, com 3 quartos, sendo duas suítes, e mais dependência de empregada. Aí é assim: você põe o sofá na sala, o sofá de três lugares, mas não cabe o de dois; a TV tem de ser de 14 polegadas, porque vai ficar quase diante do seu nariz; num dos quartos vai a cama, e no outro o armário; caso eu habite um desses, o terceiro quarto fica para os livros, dos quais devem caber apenas um terço dos que tenho. Os banheiros saõ engraçados: sentando no vaso, os joelhos encostam na parede da frente; e felizmente não sou homem porque penso que se fosse teria que me preparar para usar o banheiro ainda fora do quarto, já que lá dentro não há espaço para abrir o zíper. E a dependência de empregada? É naquele caixote que querem que um ser humano durma? Naquele caixote sem janelas? Uma múmia egípcia estaria mais confortável no seu sarcófago.

As torres

As torres

Esses apartamentos/colméias distribuem-se muitas vezes em torres de número variado, com a chamada área de lazer com diversos equipamentos como piscina, parque, salão de jogos, salas de ginástica, salão de festas, churrasqueira… mas eu não uso nada disso. É o apartamento ideal para o casal jovem: ambos trabalham fora, e só chegam em casa à noite onde, depois de ver Tv por meia hora, caem no sono. Os filhos, protegidos e acompanhados pelas empregadas, desfrutam da área de lazer durante o dia, quando não estão na creche ou na escola. Perfeito. Para eles, não para mim.

Olhaí a tal varanda-gourmet!

Olhaí a tal varanda-gourmet!

Já o segundo tipo de apartamento é o inverso. É o apartamento do novo-rico. Duzentos, trezentos metros quadrados, quatro suítes com closets, sala para home-theater, outras salas “íntimas”, quatro vagas na garagem, hidromassagem, ofurô, adega, escritório, e uma coisa chamada “varanda-gourmet”, que é uma varanda grande que tem numa das extremidades uma churrasqueira. Aí eu imagino: o cara começa a vida morando na periferia, fazendo churrasco “na laje” e convidando toda a vizinhança; depois melhora de vida e vai para um condomínio-colméia com churrasqueira coletiva, mas descobre que aí já não é mais tão agradável se misturar com os semelhantes. Daí a alguns anos os filhos crescem, ele progride mais, e então está pronto para a varanda-gourmet, que não deixa de ser uma forma sofisticada de “churrasco na laje”…

Ah!... Um loft!

Ah!... Um loft!

As construtoras e arquitetos – ou ambos – e ainda o mercado imobiliário não estão nem aí para pessoas como eu, que vivem sozinhas, que têm móveis e objetos queridos dos quais não querem se desfazer, que possuem coleções que precisam ser acomodadas, e que não necessitam de um monte de cubículos, nem de área de lazer ou “varanda-gourmet”. E fico vendo aqueles filmes americanos como “Ghost”, por exemplo, e doida pra morar num “loft”, aquele “vão” enorme onde eu pudesse espalhar minhas coisas e andar, caminhar para lá e para cá nas horas em que estou atrás de idéias para escrever estes meus textos.

Minha sala, na Parahyba.

Minha sala, na Parahyba.

Eu só quero uma sala grande – grande é o modo de dizer, de uns 25 a 30 m2. A que tenho agora é formada por dois quadrados: um de 3m x 3m e outra de 4m x 4m e cabe muito bem meu conjunto de estofado, minha TV, a cadeira que reclina, e minhas mesinhas com porta-retratos e coleções de caixinhas. Nem mesa de jantar eu tenho. Pois é: aquela mesa que todo mundo tem, com seis cadeiras e guarda-louças, eu não tenho, porque não preciso! Além da sala, preciso de um segundo cômodo que é o quarto, para a cama, a cômoda e um pequeno armário de um metro de largura; e o terceiro cômodo para os livros. Se a sala for grande, ponho os livros na sala e elimino um cômodo! A cozinha, um lugar para lavar roupa, e pronto. Mas tudo de um tamanho que eu possa dar três passos sem esborrachar o nariz numa parede.

Uma varandinha, uma rede...

E quero uma varandinha, uma rede...

Então, meu caro leitor, está duro de encontrar. Mas eu vou insistir. Continuo procurando. Além do que citei acima, gosto de “vista”. Preciso de uma varandinha que caiba a rede, e que dê pra ver o mundo, as estrelas de noite, e a lua quando nasce, ou Vênus, logo antes do  amanhecer. Tem que ser um pouco alto, mas não precisa ser de frente para o mar. Gosto muito de observar a vizinhança, casas, quintais, copas de árvores, carros, avenidas e eventualmente outros edifícios, desde que não fiquem muito perto do meu.

Encontrei um assim: um céu. Vigésimo andar, tamanho razoável, vendo toda a baía de Ponta Negra. Mas entre aluguel, condomínio, IPTU e outras taxas saía por mil e setecentos reais, e eu não posso pagar tanto.

Mas espero. Como minhas intenções são boas, meu espírito está em paz e sempre me alinhei ao lado das forças do Bem e da Justiça, sei que o Universo vai me oferecer, na hora adequada, a morada dos meus sonhos, onde eu possa viver mais um período da minha vida, no meio dos meus livros e fotos, perto dos meus filhos e netos, nesta cidade que, apesar de impossível, é a mais concreta possibilidade de vida que eu tenho agora.


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Camas

Clotilde Tavares | 28 de junho de 2009

Domingo, dia bom pra passar o dia na cama, nosso assunto – visual – de hoje.

Começando com a cama de Luís XVI, no Louvre.

Cama do rei

Achei na Wikipedia.


Cama de Elvis Presley.

Cama de Elvis Presley.

Achei aqui.


Cama de Mahatma Gandhi.

Cama de Gandhi.

Achei aqui.


Cama do Padre Cícero Romão Batista.

Cama do Padre Cícero Romão Batista.

Achei aqui.


Cama de Ernest Hemingway. Um gato dorme sobre ela, como ele gostava.

Cama de Hemingway. Um gato dorme sobre ela, como ele gostava.

Achei aqui.


Cama de Napoleão Bonaparte em Versailles.

Cama de Napoleão Bonaparte em Versailles.

Esqueci onde achei.


Cama de Jackie Kennedy, na casa Branca.

cama_jacqueline_kennedy

Achei aqui.


Minha cama.

visao geral

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Michael Jackson: Too bad too bad about it!

Clotilde Tavares | 26 de junho de 2009

Michael Jackson não foi um dos meus ídolos. É claro que eu o conhecia, desde a época do Jackson Five, e acompanhei mais ou menos a sua trajetória na música, sem prestar muito mais atenção a ele do que prestava a outros cantores americanos de que eu gostava mais.

Na década de 1970, meu filho mais velho tinha um grupo de dança de rua, tipo “break” e eu comecei a prestar mais atenção naquele artista cuja performance no palco era tão precisa, tao enérgica, tão elétrica, tão sensual. Quando em seguida a minha filha um pouco mais nova tornou-se pré-adolescente, também virou fã do cantor e vivia a me pedir uma roupa cheia de zíperes, de couro preto, igualzinha à dele. Comecei a prestar mais atenção no artista e cada vez gostava mais.

Era o dia todo rodando o vinil Bad, naqueles tempos pré-CD. Too bad! Too bad! Too bad! E quando o clip aparecia na TV, eu largava tudo e ia olhar. E depois foi a vez de Thriller.

Nunca me interessei pela vida particular do artista. Sei que casou com a filha do Elvis, que teve filhos com outras mulheres, que se envolveu em escândalos com crianças, que tinha uma doença na pele que terminou deformando seu rosto e que aparecia com máscara e óculos escuros em frente às câmeras de TV para evitar os paparazzi e para não expor sua privacidade, sua e de seus filhos.  Nunca fiz julgamentos morais de artistas. Acho bobagem.

Para mim, a doação da música, da dança, da energia vibrante e alegre sobre o palco foi suficiente, e eu a aceitei carinhosamente, como um presente que o artista quis me dar, a mim e a seus milhões de fãs, e é isso que agora importa, nessa hora em que registro com tristeza a morte dele, ocorrida hoje à tarde.

É isso que quero agradecer aqui. O mais, é coisa da Vida, tão misturada com a Morte que às vezes a gente pensa que é tudo uma coisa só. Too bad!

UPDATE – O leitor avisa que eu inverti as datas, que Thriller veio antes e Bad depois. Eu me lembro de tudo junto, e o tempo da recordação é assim mesmo, misturado. Fica feita a observação.

MIchael

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Bad, Michael Jackson, Thriller
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Facilitando a vida

Clotilde Tavares | 25 de junho de 2009

Hoje, com preguiça de escrever, vou lhe apresentar aqui umas dicas de organização e facilitação da sua vida, retiradas dos sites que visito o tempo todo e todas testadas por mim.

1 No site Efetividade.net o que fazer com os documentos, recibos de bancos e extratos de contas. Jogo ou não jogo fora? A respota está aqui. http://www.efetividade.net/2009/06/23/organizacao-de-documentos-em-casa-nova-lei-pode-acabar-com-nossas-montanhas-de-recibos/

2 Antonio Azevedo diz: “Faça agora”. E é mesmo! http://www.antonioazevedo.com.br/2008/10/faca-agora/

3. PocketMod ajuda. Faça um para você. http://repocketmod.com/

4. Use esse diagrama de produtividade http://rmaues.org/blog/2009/03/27/nerdy-productivity/

5. A melhor lista telefônica virtual. http://www.102web.com.br/telemar.htm

6. Tabela supercompleta de calorias. http://www.cdof.com.br/nutri4.htm

7. Cozinha pra quem não sabe cozinhar direito. http://www.muitogostoso.com.br/

8. Um timer on line para você não esquecer a panela no fogo. http://e.ggtimer.com/1minute

9. Converta qualquer documento em PDF. http://www.freepdfconvert.com/

10. E se o barulho da vizinhança lhe incomoda, informe-se aqui. http://www.chegadebarulho.com/

Finalmente, se nada der certo, chame o Aristeu.

aristeu-evangelico-honesto_1

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As estampas do sabonete Eucalol

Clotilde Tavares | 24 de junho de 2009
Carrinhos do Kinder-Ovo

Carrinhos do Kinder-Ovo

Ontem o meu neto veio me visitar e perguntou onde estavam os meus carrinhos. Os carrinhos aos quais ele se refere é uma coleção de minúsculos carrinhos, motos, caminhões, barcos e aviões que eu fiz durante um tempo da minha vida e que vinham dentro do “Kinder-Ovo”. Para quem não sabe do que se trata, o Kinder-Ovo é um “ovinho” que tem chocolate numa metade e um “brinquedo” na outra, geralmente coisas minúsculas e bonitinhas. Eu passei um tempo da minha vida colecionando tudo o que fosse de veículo que saía dentro dos ovinhos, depois de comer o chocolate.

Aí, por tabela, me lembrei de um dos maiores fetiches dos colecionadores brasileiros que são as estampas do sabonete Eucalol, que ainda conheci na minha infância. Entre meus tesouros infantis, tinha algumas, que terminaram sumindo na voragem dos anos. Mas o que eram essas estampas?

Nas caixas de sabonete Eucalol vinha sempre esse pequeno retângulo ilustrado em papel-cartão, mais ou menos do tamanho e formato de uma carta de baralho e “durinha”. Eu lembro de que guardava as minhas, que eram poucas, amarradas numa cinta de elástico, e trocava com outras crianças quando havia duplicatas.

Elas começaram a circular em 1930 e foram até 1957. Havia séries temáticas, como “A Vida de Santos Dumont”, “Aves do Brasil”, “Compositores Célebres”, e outras. Foram ao todo 54 temas distribuídos em 2.400 estampas.

Samuel Gorberg, pesquisador e colecionador, é autor de um livro sobre o assunto, com muitas informações on line no seu blog. Segundo Gorberg, séries como “História do Brasil” e “Lendas do Brasil” eram usadas em escolas pelo Brasil afora como material didático; uma das séries mais interessantes é “Viajando pelo Brasil”, desenhada pelo artista Percy Lao, que ilustrava os livros do IBGE.

O colecionardor Ariel Schneider, no seu site dedicado aos colecionadores e ao colecionismo, refere ter todas as 2.400 estampas na sua coleção, contando todo o seu trabalho para conseguir completá-la. Encontrei em vários sites da Internet as estampas para venda com preço que variam entre R$ 10,00 a R$ 25,00 cada.

Nasci com o vírus do colecionismo. Tenho a forma atenuada da doença e por isso me controlo e não encho a casa de objetos. Mas lá estão minhas caixinhas, meus folhetos de cordel antigos, minhas edições de Hamlet, meus livrinhos minúsculos, minhas canecas de louça, os livros sobre temas medievais… Entre esses objetos faz falta a minha nascente e desaparecida coleção de estampas do sabonete Eucalol, que deve ter se perdido quando eu fui para o internato aos oito anos de idade. Poucas, manuseadas, amarradas num elástico. Inesquecíveis.

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Alavantu, anarriê!

Clotilde Tavares | 23 de junho de 2009

quadrilha_estili_04Todo ano e sempre por esta época eu abro espaço nas minhas colunas para falar sobre esse fenômeno das quadrilhas juninas, completamente desvirtuado desde que inventaram essa tal de quadrilha estilizada. O meu caro leitor, muito mais bem informado do que eu, poderia até dizer que eu não posso reclamar, uma vez que a cultura popular é assim mesmo, sujeita a mudanças, a modificações, e que essa dinâmica é uma característica do folclore.

Mas eu lhe digo que essas tais quadrilhas estilizadas não têm nada a ver com folclore ou cultura popular, sendo nada mais nada menos do que cultura de massa, criadas e veiculadas pela mídia televisiva, que lhes dá suporte, promoção e divulgação. Essas quadrilhas estilizadas surgiram há mais ou menos uns quinze ou vinte anos e apareceram primeiro, se não me engano, no programa da Xuxa, na TV Globo, como parte das coreografias apresentadas ali. O que sai na Xuxa o Brasil copia, e foi isso que aconteceu.

Definindo melhor, eu diria que estas quadrilhas são ” uma nova forma de expressão junina, que não é uma quadrilha matuta, mas um grupo de dança que tem uma coreografia própria, com passos criados exclusivamente para a música escolhida, como num corpo de balé. O grupo incorpora alguns personagens como Lampião, Maria Bonita, vaqueiros, espanholas e ciganos. Os seus trajes lembram roupas típicas do folclore dos pampas gaúchos, de uma escola de samba ou o faroeste americano.” Então, chamar este tipo de espetáculo de “quadrilha junina” e dizer que ele “preserva nossas tradições culturais”, como tem sido feito pela mídia, é exagero e falta de informação. Estas quadrilhas são simplesmente uma estilização bela e luxuosa mas artificial das verdadeiras quadrilhas juninas originais.

Quadrilha estilizada.

Quadrilha estilizada.

Da mesma forma que os Carnavais fora de época, que não têm nada a ver com o Carnaval de verdade; e os Rodeios e Vaquejadas atuais, que há muito se distanciaram da Vaquejada Nordestina, essas quadrilhas não têm muito a ver com a tradição original e são eventos fabricados para atender a uma necessidade de diversão de um segmento da população e para dar lucro aos empresários do setor. Um negócio, como outro qualquer, organizado pelas afiliadas da TV Globo em todas as capitais do Nordeste, com um forte esquema de divulgação através de VTs no horário nobre. Funcionam como um concurso, com várias eliminatórias, e no dia da final há chamadas ao vivo de meia em meia hora. Nenhum evento da cultura popular, com exceção talvez do Carnaval, tem uma cobertura tão maciça.

Quadrilha estilizada.

Quadrilha estilizada.

Quando faço esse tipo de crítica, todo mundo diz que isso é bobagem, que é um evento bonito, colorido, que atrai público. Ora, não sou doida. Sei que o espetáculo é colorido, que é bonito e que atrai público. Tem mais: acho ótimo que aconteçam na cidade mais e mais eventos desse tipo. Mesmo que alguns não sejam do meu agrado é bom que existam para todos os gostos. Também encaro com muita simpatia os empresários do lazer, que vendem felicidade, riso e diversão enquanto alguns vendem armas, bombas e mísseis.

Repito: nada contra. Mas é preciso que seja feito esse esclarecimento para que tanto as pessoas de fora do Nordeste quanto as novas gerações, que não conhecem a origem da tradição, saibam a respeito daquilo que estão fazendo e vendo. Imagine só se um turista chega aqui e assiste essa quadrilha estilizada: vai pensar que está no Texas, ou nos pampas gaúchos, e não no Nordeste.

Quadrilha matuta.

Quadrilha matuta.

A quadrilha junina “de verdade” eram antigamente dançada nos salões das casas grandes de fazenda ou nas humildes palhoças dos sítios, em ocasiões festivas como casamentos, batizados e outras, eram comuns nos séculos XVIII, XIX e primeira metade do século XX copiando, à maneira simples do nordestino, a quadrilha francesa dançada nos salões europeus da época. “Alavantu” é “en avant tous”, que quer dizer “todos à frente” e “anarriê” quer dizer “en arrière” , “para trás”, em francês.

Quadrilha matuta.

Quadrilha matuta.

Com a modernização e a entrada do Nordeste no século XX, com estradas, rádio e outros hábitos que foram incorporados à vida da região, as quadrilhas originais foram aos poucos deixando de existir e passaram a ser dançadas apenas no São João, acompanhando uma encenação mais ou menos improvisada de um casamento matuto. É um resquício, uma “sobrevivência”, como dizem os folcloristas, de algo que não existe mais na sua forma original. Em toda festa de São João, não importa o tamanho e a quantidade de pessoas, sempre se dança uma quadrilha, que é tanto mais divertida quanto mais improvisada.

Atualmente, como vi hoje no noticiário da Rede Globo, os concursos são organizados em três categorias de quadrilha: estilizada, comédia e tradicional. Na tradicional, ou matuta, segundo as explicações do apresentador, as moças se vestem com vestidos de tecido barato, geralmente chitão, e os homens com calças remendadas e chapéus de palha. Além disso, eles se movimentam utilizando “trejeitos próprios dos sertanejos” – mas aqui pra nós eu nunca vi um sertanejo andar daquele jeito, pelamordedeus.

Quadrilha estilizada: parece o can-can!

Quadrilha estilizada: não parece o can-can?

Na quadrilha estilizada, os homens usam terno e as moças usam vestidos luxuosos e bordados. Há um enredo, uma música que todos têm que cantar composta especialmente para essa quadrilha, e as coreografias são muito elaboradas, executadas em ritmo frenético, exigindo um preparo de maratonista para os dançarinos. Mal comparando, parece uma escola de samba e incluídos nos seus “enredos” mirabolantes já vi berrantes do Mato Grosso, pioneiros quakers da Nova Inglaterra, mulheres holandesas de touca e tamanquinho, cowboys americanos no estilo Tom Mix, negrinho do pastoreio e o mais de maluquice e aberração histórica que você possa imaginar.

Já na quadrilha estilo comédia, e ainda segundo a matéria veiculada, as celebridades viram alvo do humor. Homens se vestem como Xuxa ou Madonna, mas não esclarece se mulheres se vestem como Brad Pitt ou Ronaldo Fenômeno.

Hoje, véspera de São João, data que para mim tem conotações religiosas e de tradição muito profundas, que fazem parte da minha cultura, das minhas raízes e cujos sons e práticas correm forres e quentes junto com o sangue das minhas veias, fica o esclarecimento, o protesto e a esperança de ver um dia na mídia com igual destaque o verdadeiro São João da minha terra, a alegria do meu povo! Quem sabe, um dia?

UPDATE – Alguém me esclareceu hoje que as tais quadrilhas “estilo comédia” são compostas apenas por homens, vestidos de “homens” e de “mulheres”; e que as músicas e danças executadas pelos “casais” têm forte conotação sexual, imitando as coreografias do forró de plástico e das bandas de axé.

UPDATE 2 – Como o meu leitor habitual está farto de saber, só publico aqui os comentários que estiverem dentro do espírito deste blog. Este assunto das quadrilhas desperta paixões e sentimentos exacerbados de pessoas que não lêem direito o que escrevi acima e que ficam indignadas porque a minha opinião é diferente da deles. Além disso, ficam querendo discutir entre si, transformando a área dos comentários em arena ou campo de batalha. Para isso estou fechando esse post para comentários. Agradeço a todos que escreveram.

<a href=”http://clotildetavares.files.wordpress.com/2009/06/quadrilha_estili_01.jpg”><img class=”size-thumbnail wp-image-1238″ title=”quadrilha_estili_01″ src=”http://clotildetavares.files.wordpress.com/2009/06/quadrilha_estili_01.jpg?w=150″ alt=”Quadrilha estilizada: parece o can-can!” width=”150″ height=”112″ /></a>

Quadrilha estilizada: parece o can-can!

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O sonho de Poliphilo

Clotilde Tavares | 22 de junho de 2009

polifilo02Há algum tempo a editora Planeta publicou o romance O Enigma do Quatro, de Ian Caldwell e Dustin Thomason, cujo enredo versa sobre a busca do significado de outro livro, o clássico Hypnerotomachia Poliphili, impresso no finalzinho do século XV. Apaixonada que sou por temas medievais e por livros, corri a adquirir o tal romance. A ação se passa no campus de uma universidade americana, mas o enredo é mal construído, confuso e, antes da metade eu me perdi irremediavelmente nas imperfeições do estilo e terminei por passá-lo adiante, sem terminar de ler.

poliphiloMas o livro teve a virtude de me apresentar esta espetacular obra, a Hypnerotomachia Poliphili, cujo título quer dizer “O Combate de Amor de Polifilo num Sonho” e que conta a indecifrável e obscura história de Polifilo à procura de sua amada, Polia. A linguagem utilizada é o italiano arcaico, com intervenções gregas e latinas e enriquecido por 171 xilogravuras da escola de Andrea Mantegna.

polifilo01Considerado um dos mais belos livros que existem, Hypnerotomachia Poliphili foi impresso em 1499 pelo veneziano Aldo Manuzio, e representa uma revolução na arte editorial, em termos tipográficos, em relação às ilustrações e à diagramação. Sua autoria é incerta, talvez de Francesco Colonna (1433-1527), talvez de Leon Battista Alberti (1404-1472) e somente agora, depois de quase 500 anos, foi realizada a sua tradução integral.

Parte narrativa imaginária e parte tratado erudito, este livro intriga há séculos historiadores e arquitetos pelas representações de edifícios e estruturas físicas ali ilustradas; contém ainda um inflamado discurso da heroína, Polia, defendendo os direitos das mulheres expressarem a própria sexualidade, e isso escrito quinhentos anos atrás.

polifilo03É um livro raro. Dele, existem menos exemplares do que da Bíblia de Gutemberg, supondo-se que haja apenas uns 200 no mundo inteiro. O único que existe no Brasil pertence ao bibliófilo José Midlin, que não revela quanto pagou pelo volume mas diz que o livro se paga cada vez que é folheado. Aliás, José Midlin doou sua magnífica biblioteca à USP em 2006; e os livros estão passando por um processo de digitalição, e vão fazer parte do projeto Brasiliana-USP, sendo que alguns já estão disponíveis na Internet. Mas isso é assunto para outro post.

poliphilo2Meu assunto de hoje é a Hypnerotomachia Poliphili. A raridade e o preço não nos impedem de conhecer essa obra primorosa. Antes que o projeto Brasiliana-USP coloque no ar sua edição fac-similiar, ela já é há tempos disponível aqui neste link.  Mesmo que para nós seja indecifrável o italiano antigo, as belíssimas ilustrações estão lá, à disposição de qualquer criatura, para deleite dos olhos e reconhecimento da cultura renascentista que, ainda hoje, encontra eco nos nossos espíritos e na nossa memória. Vale a pena a visita.

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Gerúndios

Clotilde Tavares | 21 de junho de 2009

… LENDO Memórias de Eloy de Souza
… ESCREVENDO minhas recordações, enquanto estou lembrada.
… COMENDO nestes dias camarão com Karl Leite, ratatouille com Estêvão Lúcio e pizza com Carlinhos e Ilana.
… DORMINDO marromeno…
… MATANDO as saudades de parte dos meus livros que estão em Natal.
… ASSISTINDO Marcas da Violência com Viggo Mortensen.
… ABRAÇANDO filhos e netos em Natal-RN por esses dias.
… ACARICIANDO meus gatos Teobaldo e Irlanda, que se deitam no meu colo sem serem chamados.
… ENCONTRANDO amigos queridos.
… PESQUISANDO preços.
… PLANEJANDO umas coisas.
… REVISITANDO esta cidade impossível.

Tela de Vicente Vitoriano, artista plástico do Rio Grande do Norte.

Tela de Vicente Vitoriano, artista plástico do Rio Grande do Norte.

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Bikes

Clotilde Tavares | 20 de junho de 2009

Adoro bicicletas. Nunca aprendi a andar numa.

Abrindo o desfile, uma tela de Flávio Freitas e a foto que fecha é minha, tirada na praia de Camboinha, em João Pessoa-PB. As outras encontrei por aí na Internet.

flavi6

2-roues-et-3-coouleurs

bicicleta

bicicleta_bruges

bicicletavvvvv

galerie-membre,velo,ca-doit-etre-un-bar

velo_grupo

Imagem 028

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