Preciso de um vestido
Clotilde Tavares | 28 de abril de 2010Em 1999 eu estava à procura de um vestido para vestir no lançamento do meu livro “A Magia do Cotidiano”. Depois de uma busca infrutífera pelas lojas, resolvi vestir uma roupa que eu já tinha e no domingo seguinte escrevi a crônica abaixo para a Tribuna do Norte, jornal de Natal no qual escrevi semanalmente aos domingos durante mais de dez anos.
Bem: o texto tem onze anos que foi escrito, e sempre agrada muito. É engraçado mas reflete um problema que afeta muitas mulheres, de todas as idades: a dificuldade de encontrar roupas que lhe caiam bem, porque as modelagens que estão nas lojas são feitas para mulheres como Gisele Bundchen.
É disso que trata o blog da Beth Viveiros, 32 anos, de São Paulo. “Tenho 1,78 m, 94 quilos e númeração de roupa indefinida”, diz ela, e está fazendo uma pesquisa sobre mulheres que “não cabem” na moda que está nas lojas.
Visitem, respondam a pesquisa, divulguem. E leiam meu texto abaixo que continua mais atual do que nunca com uma diferença: minhas medidas aumentaram…
PRECISO DE UM VESTIDO
Publicado na Tribuna do Norte / Natal-RN em 30 de setembro de 1999.
Hoje quero usar o espaço desta coluna para um apelo. É que estou precisando desesperadamente encontrar uma loja onde eu possa comprar um vestido. O meu caro leitor já deve estar pensando que eu pirei de vez e eu lhe respondo que poucas situações no mundo são tão carregadas de significados ocultos e de estresses psicológicos como essa em que me vejo agora: a situação de uma mulher, precisando de um vestido novo.
Explico melhor. A indústria de confecções, o pessoal das griffes ou seja lá quem for que fabrica roupas neste país hoje em dia pensa que toda mulher tem um metro e setenta e cinco de altura, cinqüenta e cinco quilos, cinqüenta e dois centímetros de cintura e busto tamanho quarenta. Mas não é só isso.
As vendedoras, quase todas esquálidas moçoilas vestidas com roupas das griffes que vendem e com cara e atitude de modelos famosas, não fazem o menor esforço para arranjar algo que sirva para esta colunista que vos fala, com meus saborosos sessenta quilos distribuídos agradavelmente por um metro e meio de altura.
Outra coisa estranha é a questão do decote. Gosto de decotes. Aliás, o colo é uma das coisas mais bonitas e charmosas que as gordinhas possuem, devidamente valorizado pelos decotes. Pois bem: nas lojas só existe roupa decotada para quem tem busto mínimo que, aliás, torna o decote desnecessário. Mostrar o que não existe? Pois é.
Ai, como sofro nestas lojas! Deve ser esse o castigo que o céu me reservou por ter abusado das tortas, chocolates e biscoitos de que gosto tanto. Uma das vendedoras chegou a me olhar de alto a baixo e dizer: “Se a senhora emagrecesse…” Pode? Minha linda, a sua roupa é que tem que servir para mim e não eu me sacrificar para entrar na sua roupa. Onde já se viu?
Mas na maioria das vezes as vendedoras não falam. Comunicam-se em silêncio, numa linguagem secreta de olhares e movimentos de sobrancelhas que aprendi a decifrar. Quando entro na loja, elas se olham e uma sinaliza para a outra: “Outra gorda!” A resposta vem, em silêncio: “Não tem nada na loja que sirva para essa baleia”.
Foi assim sexta-feira passada, onde arrastei por todas as lojas a minha figura fofa e quase à beira de uma ataque de nervos, pois precisava do vestido para um compromisso social, onde acabei indo com uma roupa qualquer.
O pior de tudo é que, apesar das minhas medidas serem excessivas para as griffes chiques deste meu país brasileiro são ainda muito reduzidas para as lojas onde se vende roupas para gordas. Nelas descubro que para ser gorda de verdade eu teria também que ser alta, já que as blusas que provo arrastam pelo chão, como vestidos longos.
Então, caro leitor, aqui fica o meu apelo. Se você conhece algum lugar onde se venda roupas para mulheres que nem eu, tipo mignon, fofinhas e felizes, e onde as vendedoras sejam simpáticas, gostem de agradar os clientes e de vender, é só me avisar.