Por favor, deixem-me comprar!
Clotilde Tavares | 29 de setembro de 2010Ando ultimamente cuidando de temas pessoais: arrumando a casa, verificando o closet, jogando fora coisas velhas que não vou usar mais, reorganizando pastas e arquivos, essas coisas que a gente faz quando termina um trabalho grande e quer dar um tempo antes de começar nova e intensa atividade intelectual.
Entre as muitas coisas que estou fazendo, incluem-se as compras, e organizada que sou, fiz uma listinha. Coisinha simples: uma bolsa nova, uns anéis, uma bijuteria fina – pulseira ou colar, uma sapatilha preta e outra colorida, uma espadrilha (ah, não sabe o que é? Veja aqui!), underware underwear (porque não acho chique dizer “calcinhas”), hidratante, umas duas ou três écharpes para renovar meu estoque – adoro écharpe, tenho várias – e mais uma meia dúzia de miudezas que fazem a felicidade de qualquer mulher, principalmente as escritoras que nem eu que precisam desses ataques de futilidade antes que se tornem umas chatas irremediáveis, falando somente em livros e autores.
Mas comprar é difícil, meu caro leitor. É difícil porque as vendedoras não deixam. Nenhuma delas – ou as pessoas que as treinam – entende que o cliente precisa de longos momentos de silenciosa reflexão antes de decidir se vai levar o sapato, a bolsa ou a blusa para casa. Tem que responder a questões profundas e fundamentais como: esse sapato dá certo com as roupas que eu tenho? Essa bolsa não é igualzinha àquela que comprei por impulso e uso tão pouco? Ou essa blusinha não vai chamar a atenção para a celulite do meu braço? E muitas e muitas outras perguntas importantes e que precisam ser respondidas intimamente e em silêncio enquanto estamos aparentemente absortas em frente à vitrine.
Mas nenhuma vendedora deixa que esse processo aconteça. Ela diz: essa bolsa chegou ontem e está num preço ótimo (Ótimo para quem, pergunto, se a bolsa custa R$ 600?). Esse colar está muito em gosto (Não precisa estar “em gosto”, eu é que tenho de gostar dele). Essa sapatilha calça muito bem e temos e mais duas cores (Mas eu quero preta, e já vi que você não tem). Nós também dividimos em quatro vezes no cartão. No cheque a senhora pode dar o primeiro para quarenta e cinco dias (Não perguntei sobre preço.) E bla bla bla, e eu sem poder pensar.
Quando você diz que está só olhando ela finalmente se cala, mas permanece ao seu lado ou nas proximidades, como uma unidade viva e pulsante de energia ansiosa que não sei se perturba os outros mas me perturba, e muito. Fora isso, quando você finalmente gosta de um artigo, pede para ver, e o artigo não lhe agrada, ela lhe dá as costas e vai amuada para o fundo da loja como fizeram hoje comigo,
Cansada disso tudo fui almoçar, e na praça de alimentação, apesar dos cartazes de um metro de altura mostrando expressivas fotografias coloridas dos pratos, a jovem que estava ali a postos de cardápio em punho quase me enlouquece desfiando todos os pratos principais e os acompanhamentos possíveis.
Então, minha gente, a vida é dura quando precisamos comprar. Eu ando em busca da minha listinha colocada lá em cima, e vou conseguir, mas já entendi que algum poder superior bem intencionado me envia todas essas situações para que eu possa desenvolver as virtudes da paciência e do bom humor. Fazer o quê? Amanhã voltarei às compras.
Outros posts sobre a difícil arte de comprar – e são tantos que daqui a pouco eu faço um livro somente com esse assunto: