A forma da água (The Shape of Water, 2017)
Clotilde Tavares | 24 de janeiro de 2018#semspoiler
Guillermo del Toro está de volta com mais uma de suas fantásticas fábulas, repetindo a estética de O Labirinto do Fauno (2006).
Lendo por aí nos fóruns de cinema, vi que pessoas bem humoradas dizem que este seu novo filme deveria ter como título Amélie Poulain encontra o Monstro da Lagoa Negra mas, piadas à parte, esse é um filme espetacular em todos os sentidos. Teve mais de dez indicações ao Oscar – filme, diretor, atriz, roteiro original, ator coadjuvante, fotografia edição e mais algumas indicações técnicas.
É claro que o Oscar obedece a alguns critérios que para mim continuam misteriosos no que se refere às indicações como, por exemplo, por que indicar um filme como Corra! (Get Out)? Interessante, assistível, mas nada que mereça um Oscar. Nesse caso, porém, a Academia acertou.
A Forma da Água começa por ser uma homenagem ao cinema. Ali estão os musicais, com Fred Astaire, Carmen Miranda, Shirley Temple, o sapateado, a dança com balde e esfregão, o cinema da época, e tudo na medida certa, sem cansar o olho do espectador.
O importante é que o filme é um exercício de empatia, uma forma de olhar para o outro vendo a essência, o que existe de verdadeiro no outro e não sua aparência. A faxineira muda, que não pode e não consegue falar por um trauma de infância, e o Monstro, também mudo porque monstro, não humano – mas ambos pensam, sentem, têm habilidades, amam.
Os coadjuvantes da trama: a mulher submissa ao marido, o artista incompreendido e superado pela tecnologia, o investigador bruto e sádico com sua família de comercial de margarina, o general doa-a-quem-doer, o cientista-espião que é agente de Moscou, o ambiente da Guerra Fria recriado tão bem.
Uma cenografia que em certas horas me lembrou Brasil O Filme (Terry Gillian-1985), cheia de canos e tubulações, meus Deus, o que circula dentro daqueles canos? Tudo uma metáfora do subterrâneos e desvãos da alma humana.
E quantos elementos emblemáticos! O ovo, que inicia e estabelece a relação entre os personagens principais e simboliza a nossa origem comum, animais que somos todos e, finalmente, o elemento água, mediador de emoções. A água, ou o estado líquido, veículo de tudo quem tem a ver com desejos e sentimentos: sangue, suor, lágrima, saliva, sêmen, secreções de glândulas… Somos seres aquáticos, crescemos na piscina do líquido amniótico de nossas mães e vivemos nos desmanchando em secreções o tempo todo. Quando secamos, sobrevém a morte.
A Forma da Água é nossa forma, ou, pelo menos, a forma que deveríamos ter. Veja, e dissolva-se.
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