Pausa para a Filosofia
Clotilde Tavares | 8 de outubro de 2009Depois de alguns dias com posts sobre assuntos como poluição sonora e estresse causado pelo uso dos celulares (veja os três posts anteriores a este), e para que este blog não vire tribuna de reclamações, porque eu acho chato viver reclamando e porque acho que na vida também devem exstir momentos amenos e suaves, hoje não quero reclamar de nada.
Houve um tempo em que eu pegava pesado pelos jornais. Escrevia minhas colunas sempre apontando os problemas, reclamando por soluções, atazanando a vida das tais autoridades competentes que, na verdade, são mais incompetentes do que qualquer outra coisa. Foi aí que o escritor Nei Leandro de Castro, em texto escrito para a orelha do meu livro “A Agulha do Desejo” me chamou de “a fada zangada do cotidiano“. Eu adorei o epíteto, mas esse “zangada” passou a me incomodar, e eu fui a partir disso diminuindo a zanga, ficando mais suave, aprendendo a me divertir mais enquanto escrevo.
Continuo fiscalizando o cotidiano sim, mas não quero viver zangada e é por isso que faço intervalos generosos entre as reclamações, para que também possa, junto com meus leitores, desfrutar de outros temas.
Aí, hoje, querendo fazer este intervalo, lembrei de um conhecido meu, professor da UFRN, um cara inteligentíssimo e meio estranho.
Lá estava ele dando aula na Graduação enquanto caía uma chuva torrencial, um verdadeiro temporal. A biqueira que tinha no exterior derramava uma grossa torrente de água. Ele parou, com o giz na mão, distraído, olhando a chuva… Aí, se virou para os alunos e disse:
– Vocês querem apostar comigo como eu entro debaixo daquela água e não me molho?
– Queremos, professor! – concordaram os alunos já prontos para mais uma piração.
Ele saiu da sala do jeito que estava, arrodeou o bloco de salas de aula e veio para debaixo da bica, onde entrou com tudo e ficou uns cinco minutos debaixo da água. Depois, ainda pingando, entrou na sala de aula molhado até as cuecas. Os alunos, morrendo de rir, cobraram:
– E então professor? O senhor não disse que não ia se molhar?
E ele, pré-socrático todo:
– E não me molhei. O homem que disse aquilo era um homem diferente do homem que se molhou na bica, e a água também já era outra…
Puro Heráclito de Éfeso, que disse: “Nenhum homem pode banhar-se duas vezes no mesmo rio, pois quando ele ali entrar a segunda vez, já é outro homem, e o rio também já é outro.”
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