Umas & Outras

Arte, Cultura, Informação & Humor
  • rss
  • Início
  • Quem sou?
  • #DiretoDaBolha
  • Livraria
  • FotoComTexto

A delícia das coisas simples

Clotilde Tavares | 9 de setembro de 2010

Convido hoje o meu caro leitor para um reflexão a respeito da extrema delícia das coisas simples. Isso não quer dizer que eu não goste do requinte, da sofisticação. Mas além disso está a simplicidade, que termina sendo o extremo requinte. A simplicidade é o requinte do requinte.

Por exemplo, uma rede. Quer coisa mais simples, e que consegue dar mais prazer do que uma rede? Uma simples pedaço de pano grosso, suspenso no ar a partir dos seus extremos, móvel, balouçante e macia, herança preciosa dos nossos antepassados indígenas? Uma rede é a glória, a glória suprema. Mas é preciso saber se deitar, e não é todo mundo que sabe se deitar numa rede. É preciso descobrir o ângulo absolutamente certo entre a posição do seu corpo e a beirada da rede.

Falando em simplicidade, e em rede, lembro logo do sertão e de uma pousada em que fiquei hospedada em Paraú, ou Espírito Santo do Oeste, no Rio Grande do Norte. Quando cheguei na pousada, a mulher olhou assim para mim e disse “- Você dorme de rede?” Eu, cansada que vinha, caí nos braços dela: “- Durmo, querida…” Mergulhei então no berço daquela rede, dentro da qual fiquei me espojando feito um potro novo, preguiçando e espantando o cansaço… A rede era vermelha e a varanda era um poema de crochê, pesada, tecida numa linha grossa. Joguei-a por cima de mim e ela veio, se adaptando ao meu corpo, me fazendo uma carícia, aquela varanda pesada… Ô delícia…

O quarto tinha apenas a rede e uma cadeira onde coloquei a mala, mas era limpíssimo, paredes alvas e o chão brilhante de tão esfregado. O meu caro leitor talvez achasse essa hospedagem pobre, mas eu lhe digo que somente a rede era melhor do que aqueles apartamentos de hotel metido a besta de interior, com frigobar e outras bobagens. Para que é que eu vou querer um frigobar, quando posso dizer: “- Ei, a senhora tem um docinho?” ou “- Comadre, me arranje um cafezinho…” Telefone também não é necessário porque posso me levantar e chamar quem eu quero. Está todo mundo ali, pertinho, ao alcance da voz.

Depois, o jantar. Um jantar sertanejo. Arroz de leite, alvo, os pedacinhos de queijo amarelinhos apontando aqui e ali no meio do arroz. Carne assada, um feijãozinho macassar bem sequinho, sem muito caldo, e uma batata doce merecedora de um poema, uma canção, enxutinha, uma delícia. Depois, um suco de maracujá delicioso, feito com maracujá que não é comprado em supermercado porque é completamente diferente daquele que eu tomo em casa.

Pedi doce, não tinha, mandaram comprar. Daí a pouco entrou Salete – que é o nome da dona da pousada e criadora dessas delícias – com o pedaço de doce espetado na ponta de uma faca. Fiquei me sentindo medieval, comendo com a faca, metendo a faca na boca e com olhos molhadinhos de lágrimas, lembrando de que Mamãe, lá de Coxixola, na Paraíba, me servia doce desse mesmo jeitinho. Depois Salete me trouxe café e água e eu disse: meu Deus, eu não saio mais daqui.

Mas tive que sair, caro leitor. Tive que seguir viagem, mas acrescentei às minhas experiências essa, especial entre todas: o sertão e a sua simplicidade, das pessoas e das coisas.

Essa é mais uma das crônicas já publicadas no meu livro “A Agulha do Desejo” (Natal, Engenho de Arte, 2003), que você encontra na Estante Virtual e em breve disponível para download gratuito aqui mesmo neste site. A foto é minha, de 1999, e mostra as cercanias da cidade de Paraú-RN.

Comentários
8 Comentários »
Categorias
Cultura, Viagens e turismo
Tags
Cariri, Paraú, rede, sertão, simplicidade, sofisticação
Comentários RSS Comentários RSS
Trackback Trackback

Ri-ri, miss e Jesus

Clotilde Tavares | 15 de agosto de 2010

Talvez o meu caro leitor não saiba, mas sou uma moça prendada, educada em colégio de freiras e dominando habilidades que hoje não mais fazem parte da educação das jovens. Assim é que sei costurar, bordar, fazer tricô, crochê e ponto de cruz. Imbuída da importância de tais tarefas, e horrorizada com o preço cobrado pelas costureiras, vez por outra resolvo eu mesma costurar, tarefa na qual me saio muito bem, apesar de certa dificuldade em enfiar a linha na agulha.

Entre os aviamentos usados na arte da costura, um dos mais comuns é o fecho éclair, que sempre me faz lembrar de uma conhecida minha, que chamava essa peça de “flash”, segundo ela porque abria e fechava com rapidez. Ora, essa explicação tem tudo a ver, já que “éclair”, em francês, significa relâmpago. Minha mãe o chamava de “ri-ri”, pelo barulhinho que o fecho fazia ao deslizar. E se você achou engraçado, caro leitor, lembre-se de que em inglês o termo para esse tipo de fecho é “zipper”, que vem exatamente da palavra “zip”, que quer dizer silvo, sibilo. Tanto a palavra sertaneja como a inglesa servem ao mesmo propósito: designar o objeto aludindo ao som que ele provoca.

É curioso observar os nomes que as coisas adquirem, de acordo com o estado, ou a região. Eu chamo aquele arco de colocar na cabeça prendendo os cabelos de “diadema”. Muita gente chama de “arco”, ou “tiara” e já vi chamarem também de “traca”.

Um simples friso de cabelo pode levar a confusões indescritíveis. Você pode andar uma cidade inteira à procura de um friso, e não vai encontrar, pois nesse local o conhecem por “grampo”. E eu andei uma tarde todinha pelas lojas da Avenida Sete, no Campo Grande, na Bahia, querendo comprar uma caixa de frisos, para somente depois, ao chegar no Hotel, descobrir que o nome daquilo, na Bahia, era “miss”. Já minha mãe, no seu linguajar sertanejo, chamava friso de “biliro”.

Tem também umas coisas que são deliciosas. No Maranhão, por exemplo, existe – ou existia – um refrigerante como um guaraná que é cor de rosa e cujo nome é “Jesus”. Uma das coisas que eu mais gostava quando ia a São Luís era entrar numa lanchonete e dizer “- Moço, me dá um Jesus!” E lá vinha o homem com aquela garrafa da cor de uma pétala de rosa.

Palavras, palavras, palavras: tão ricas, tão belas, tão saborosas. Inglesas, francesas ou sertanejas, não importa: na boca do povo ganham vida, ganham alma e graças a elas esta que hoje vos escreve tem assunto para este domingo preguiçoso.

Essa garrafinha de Jesus foi meu compadre Carlos von Sohsten quem trouxe pra mim do Maranhão no ano passado. Fui na casa dele degustar a iguaria e fiz a foto com meu afilhado Vinicius. Eu adoro Jesus!

Comentários
6 Comentários »
Categorias
Comportamento, Cultura, Curiosidades
Tags
arco de cabelo, biliro, Cariri, diadema, fecho-eclair, friso, guaraná jesus, miss, palavras, ri-ri, tiara, von Sohsten, zipper
Comentários RSS Comentários RSS
Trackback Trackback

Paraíso aberto

Clotilde Tavares | 22 de outubro de 2009

Há uma música que fala sobre o Cariri, que diz assim:

“No meu Cariri, pode-se ver de perto

tanta boniteza,

pois a Natureza

é um paraíso aberto…”

Pois é para esse paraíso aberto que estou indo hoje, meu caro leitor, passar quatro dias no Encontro dos Povos do Cariri, um evento que congrega arte, cultura, economia e negócios, e que acontece em São João do Cariri, na Paraíba.

Eu sempre fico feliz de poder voltar a essa região, sobre a qual já escrevi outras vezes aqui neste blog. O Cariri é o berço dos meus antepassados mais próximos, e é lá que fica Coxixola, onde nasceu minha mãe.

Neste final de semana vou encontrar amigos, escritores e artistas, gente da minha gente, povo do meu povo, e vou fazer o lançamento virtual do meu folheto de cordel Cariri de A a Z, onde eu louvo as belezas daquela região. para o meu caro leitor de todo dia nesse blog, faço uma gentileza especial: é suficiente clicar aqui e ler o folheto, disponível para você em formato PDF.

Mesmo viajando, o blog continuará sendo atualizado diariamente mas talvez haja uma pequena demora na liberação dos comentários e nas respostas aos emails. Segunda, 26, tudo volta ao normal.

No mais, é me desejar boa viagem e prometo que quando chegar venho cheia de novidades pra você.

"Sobrado dos Árabes" - São João do Cariri, Paraíba.

"Sobrado dos Árabes" - São João do Cariri, Paraíba.

UPDATE: Minha gente, desisti da viagem. Acordei assim com um pressentimento, uma sensação estranha, e como obedeço muito às minhas intuições, cancelei tudo. É isso. (Escrito às 7h20 da manhã de 22/10)

Comentários
Sem Comentários »
Categorias
Uncategorized
Tags
Cariri, Cariri Paraibano, Coxixola, Encontro dos Povos do Cariri
Comentários RSS Comentários RSS
Trackback Trackback

Preparativos para viagem

Clotilde Tavares | 21 de outubro de 2009
Sartre e Simone

Sartre e Simone

A escritora Simone de Beauvoir relata num dos seus livros que Sartre, seu companheiro e também escritor, sempre saía de casa com bastante dinheiro em espécie, passaporte e todos os documentos. Para Sartre, isso significava que, se lhe desse vontade, podia dali mesmo de um daqueles cafés que frequentava viajar para onde quisesse sem precisar voltar em casa. Isso significava liberdade absoluta de ir e vir.

Eu morro de inveja desse tipo de atitude porque sou daquelas pessoas que para viajar nem que seja por dois dias preciso de milhares de preparativos. Desde os tradicionais “que roupa levar”, que somente isso daria um post quilométrico incluindo minha clamorosa indecisão a respeito não somente a roupa mas sapatos, bolsas e acessórios até os meus equipamentos eletrônicos dos quais não me separo e que dão sentido à minha vida. Então: roupa, sapatos, acessórios, maquilage, notebook e sua fonte, câmera, gravador, celular e carregador, o carrgador de pilhas, agenda, caderninho para escrever, canetas, remédios, produtos dietéticos… É uma troçada sem fim, da qual preciso todo dia. Antes levava livros também, mas agora com os livros em PDF (tenho cerca de 400 títulos no notebook) não preciso mais carregar esse peso extra.

Mas antes de viajar também tenho que tomar providências domésticas. O apartamento tem que ficar todo arrumado e a cozinha limpa, senão quando a gente volta, além daquele choque inicial de abrir a porta e ver logo uma bagunça, se ficar sujeira na cozinha cria mofo e atrai insetos. É preciso também deixar as plantas com água e em lugar protegido, mas onde haja alguma luz, para que não morram.

Fora isso, e princialmente se eu for para um lugar onde não tenha Internet ou a conexão seja difícil e precária, é preciso deixar agendados os posts dos blogs, colocar as listas de discussão (quase 30!) em modo web, e enviar antecipadamente as colunas para o jornal.

Então, meu caro leitor, viajar para mim é sempre uma trabalheira; é por isso que só saio de casa se o roteiro me atrair com muita força. Como farei amanhã, indo em direção ao Cariri Paraibano. Mas os detalhes dessa viagem você vai ter que esperar até amanhã para saber.

Comentários
Sem Comentários »
Categorias
Comportamento
Tags
arrumar mala, Cariri, Sartre, Simone de Beauvoir, turismo, Viagem
Comentários RSS Comentários RSS
Trackback Trackback

Tópicos Recentes

  • GERÚNDIOS
  • ROMANCEIRO VIVO
  • Estranhas iguarias
  • Adiza Santa Cruz Quirino, “Tia Adiza” (1916-1990)
  • Como escolher um texto para encenar na escola?

Tags

barulho barulho urbano biblioteca blog blogosfera Braulio Tavares cabelos brancos Campina Grande Cariri Cariri Paraibano Carnatal cinema comportamento humano corrupção Coxixola cultura popular Design escrever escritor Fotografia e design gatos Gerúndios Hamlet Harold Bloom hoax idade Internet leitura Literatura literatura de cordel livros meio ambiente Memória Moda mundo blog Natal Nilo Tavares padrão de atendimento Paraíba poesia sertão Shakespeare teatro turismo Viagem

Categorias

  • Arte (57)
  • Comportamento (202)
  • Cultura (103)
  • Curiosidades (62)
  • Fotografia e design (20)
  • Humor (44)
  • Memória (45)
  • Pop-filosofia (12)
  • Qualidade de vida (30)
  • Sem categoria (39)
  • Tecnologia e Internet (26)
  • Uncategorized (65)
  • Viagens e turismo (27)

Páginas

  • #DiretoDaBolha
  • Livraria
  • Quem sou?

Arquivos

  • julho 2024 (4)
  • julho 2023 (7)
  • março 2023 (1)
  • abril 2022 (1)
  • novembro 2021 (1)
  • junho 2021 (2)
  • abril 2021 (6)
  • agosto 2020 (1)
  • julho 2020 (1)
  • junho 2020 (1)
  • outubro 2019 (2)
  • abril 2018 (1)
  • janeiro 2018 (5)
  • novembro 2017 (1)
  • agosto 2017 (2)
  • junho 2017 (1)
  • maio 2017 (2)
  • março 2015 (1)
  • fevereiro 2015 (4)
  • janeiro 2015 (9)
  • julho 2014 (2)
  • maio 2014 (4)
  • dezembro 2013 (1)
  • setembro 2013 (6)
  • junho 2013 (1)
  • março 2013 (1)
  • setembro 2012 (3)
  • agosto 2012 (1)
  • maio 2012 (1)
  • fevereiro 2012 (1)
  • janeiro 2012 (1)
  • dezembro 2011 (5)
  • novembro 2011 (2)
  • outubro 2011 (3)
  • junho 2011 (1)
  • maio 2011 (2)
  • abril 2011 (3)
  • janeiro 2011 (14)
  • outubro 2010 (3)
  • setembro 2010 (11)
  • agosto 2010 (3)
  • julho 2010 (5)
  • junho 2010 (2)
  • maio 2010 (5)
  • abril 2010 (13)
  • março 2010 (19)
  • fevereiro 2010 (18)
  • janeiro 2010 (17)
  • dezembro 2009 (25)
  • novembro 2009 (28)
  • outubro 2009 (31)
  • setembro 2009 (29)
  • agosto 2009 (28)
  • julho 2009 (30)
  • junho 2009 (27)
  • maio 2009 (29)
  • abril 2009 (29)
  • março 2009 (6)

Agenda

maio 2025
D S T Q Q S S
 123
45678910
11121314151617
18192021222324
25262728293031
« jul    

Meta

  • Acessar
  • Feed de posts
  • Feed de comentários
  • WordPress.org
rss Comentários RSS valid xhtml 1.1 design by jide powered by Wordpress get firefox