Os sete pecados capitais
Clotilde Tavares | 2 de janeiro de 2012Eu nunca tinha lido A Divina Comédia. Já li A Ilíada, A Odisséia, e Os Lusíadas, mas A Divina Comédia nunca. Aí me acontece que por força do ofício e da amizade, aceitei a incumbência de ler um trabalho de um amigo meu justamente sobre A Divina Comédia, com o objetivo de ver se o tal trabalho estava legal, se atendia às normas acadêmicas, essas coisas. Prudentemente, resolvi ler antes a obra, para não incorrer em nenhuma aberração conceitual ou estética, comprometendo assim a minha fama de pessoa culta e bem informada.
Li e achei um barato, mas fiquei muito impressionada com o Inferno. Nunca pensei que tivesse tanto pecado diferente no mundo. Todos os meus terrores de criança interna em colégio de freiras voltaram e eu passei bem umas duas noites sem dormir. E comecei a pensar nessa história de pecado.
No internato, no colégio das freiras, aprendi que existem dois tipos de pecado: os veniais e os mortais. Os veniais são pecadinhos bestas, como estirar a língua quando a professora está de costas ou tomar a cocada da mão do irmão menor. Os pecados mortais não. Esses são perigosos. São aqueles que levam você diretinho para o Inferno, que nos meus pavores de criança era pior, muito pior do que o Inferno de Dante. Hoje não acredito mais em Inferno. Mas acredito nos pecados. Nos pecados mortais. Naqueles que a Igreja chamou de pecados capitais.
Para quem não se lembra mais, os Pecados Capitais são sete. Desses sete, quatro são aqueles que se cometem contra o Espírito e que prejudicam tanto quem os comete quanto a pessoa contra a qual são cometidos. São a Ira, a Cobiça, a Inveja e o Orgulho. E desses, meu filho, Deus me livre. São uns pecados tão feios, tão cabeludos que eu acho que deveria existir mesmo Inferno para trancafiar de vez lá dentro todo mundo que fizesse esse tipo de coisa.
Mas os outros três, ah, meu caro leitor, os outros três são os pecados mais geniais e mais gostosos do mundo. São os pecados que se comete contra o Corpo e, se ofendem alguém, ofendem somente quem os comete. Seu efeito maléfico não se estende a outras pessoas. São a Preguiça, a Gula e a Luxúria.
E eu vou fazer o quê, pobre pecadora que sou dos pecados do corpo? Como o gato Garfield, sou deliciosamente preguiçosa, refinadamente gulosa e gostosamente narcisista, sendo o narcisismo a forma mais elaborada de Luxúria que pode existir.
Fazer o quê? Penitência? Ato de contrição? Ou será que o Inferno me espera, o de Dante e o outro, com seus abismos de fogo e lava prontos para me devorar? O que vocês acham?