A vida é como a rapadura
Clotilde Tavares | 4 de novembro de 2009Gosto muito de dizer, e até já disse aqui, uma frase ouvida nas ruas: “A vida é como a rapadura: é doce, mas é dura.” Aí, toda vez que falo isso, muita gente me envia emails oferecendo diversas versões para a mesma frase. Sabedoria popular é assim mesmo, multiforme, e nenhuma dessas formas é mais certa do que a outra. A rigor, a frase é o conjunto de todas as suas versões.
Uma leitora me questionou se, na vida e na frase, primeiro não viria a dureza, e depois a doçura. Eu penso que não. Quando você põe a a rapadura na boca, a primeira coisa que sente é o doce. O doce vem antes, para enganar, para seduzir, para fazer a gente meter os dentes nessa rapadura tão difícil de roer.
Mas cada um sabe de si; e o doce e o duro estão às vezes tão unidos que o negócio é se fazer de doido e ir roendo a rapadura da vida, devagarinho, sentindo o doce, mas sabendo que esse doce também traz o açúcar da Morte Caetana, cariando nossa força de existir.
Viver é muito perigoso, já dizia Guimarães Rosa, e não é coisa pra gente frouxa. E já que eu estou no campo das frases cito mais uma, de Ariano Suassuna, posta na boca de João Grilo, o mais soberbo personagem do nosso armorial conterrâneo: “A vida é um sutiã: o negócio é meter os peitos!”