Vem aí livro novo!
Clotilde Tavares | 18 de outubro de 2019(Na foto, o lugar onde invento minhas histórias).
Em meados de dezembro, se tudo der certo e se houver uma real e efetiva little help from my friends eu quero estar de livro novo e autografando no dia do meu aniversário.
Dia 22/10 estarei lançando a campanha de financiamento coletivo no Catarse e conto firmemente com você para apoiar o projeto e tornar possível esse livro.
Aguarde. Você receberá as informações necessárias para apoiar.
DE REPENTE A VIDA ACABA é um romance que conta a história de Maria Eulina. Durante toda a vida, ela quis ser escritora, sem nunca ter conseguido realizar esse desejo. Vive entre desacertos, dilemas e insatisfações, refém de um passado que não consegue superar. A ação ocorre na época atual, mas parte dela se situa em meados da década de 1980, quando o Brasil se defrontava com a redemocratização, a Nova República, e os planos econômicos.
Trecho:
“… “…Eu acho que fiz muito mal para essa menina. Talvez por isso ela seja assim distraída, sem objetivo, sem ambição. Pessoas dizem que não, que não é por isso, que há pais que fazem tudo certo, que se dedicam, e o filho termina sendo lá o que ele quer, não importa a criação. Pode até ser, mas eu sinto que no meu caso a culpa é minha mesmo. Mimei demais, dei atenção demais, quis para ela mais do que o universo dela comportava. E ela não é nem minha filha. É afilhada, ou melhor, afilhada não, ela me chama de Madrinha mas nunca houve um batizado. Eu acho tão pobre e tão brega essa coisa de madrinha. Coisa de tabaréu, de gente do interior. A mãe era uma mulher muito boa e foi minha empregada por anos, morreu de câncer de mama, coitada, e eu tomei conta da menina, que já vivia comigo e aqui em casa quando a mãe morreu, e já me chamava de Madrinha. Eu perguntava: Dora, quem é o pai dessa menina? Você não vai me dizer nunca? O pai dessa menina se chama um litro de rum montila, pronto, a senhora agora está satisfeita? Não sei quem é, não sei o nome, nunca vi, foi uma farra na comunidade, um baile, e eu bebi e trepei com esse homem, peguei um bucho. Não sei quem é, nunca mais vi, não procurei, não quero ver, não vou ver de novo. Mas criatura, procure ele, pode ser que ele possa lhe ajudar, que tenha emprego, que lhe ajude a criar. Não quero, não me interessa, a menina é minha, só minha. E se abalava para a área de serviço, resmungando, pegava a cria no braço e apertava com força, eu ia atrás morrendo de rir, mas criatura, você está pensando que o pai vai chegar aqui agora para levar a menina com ele? Largue ela no berço e cuide do almoço, olhe a panela derramando. E ela me olhava com olhos de raiva, beijava a cabecinha da filha e dizia, é minha, só minha. Mas terminou sendo minha, a menina. Minha, e não dela. A menina filha do litro de rum montila, a menina que nasceu depois que o meu menino foi embora. Esse sim, meu, feito da minha carne e do meu sangue e também da carne e do sangue não do litro de rum montila mas do litro de uísque drurys que bebi naquela noite. Filhos do álcool, que coisa. Tem os filhos da guerra, os filhos da ditadura, os filhos da pobreza, os filhos do álcool ninguém fala neles. Ninguém menciona essas criaturas que surgem do nada e encarnam em uma mulher solitária e embriagada, que busca nos desvãos da noite um aconchego, um abraço. A dela, a de Dora, minha empregada, filha do litro de rum montila; o meu, o meu menino, filho do litro de uísque drurys.