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O banho

Clotilde Tavares | 3 de fevereiro de 2015

banhoidademedia

Nesses tempos de falta de água, talvez a coisa certa seja retomar um costume da Idade Média, quando o banho era um acontecimento anual. Uma grande tina com água quente era colocada no aposento principal – muitas vezes o único aposento do domicílio – e o dono da casa tinha o privilégio de se banhar primeiro. Depois, e nesta ordem, vinham os filhos homens, e outros homens como sobrinhos e cunhados, então as mulheres, as crianças e, finalmente, os bebês. Nessa fase a água já estava tão suja que era fácil algo ou alguém se perder dentro da tina. Daí a frase, “Não jogue fora o bebê junto com a água do banho.”

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idade media, nao jogue fora o bebê com a agua do banho, seca no sudeste
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Uma visita importante

Clotilde Tavares | 24 de janeiro de 2015

Alessandra Stewart e eu. Dezembro de 1989.

Em 1989 eu morava em Capim Macio. Numa noite de dezembro, convidei uns amigos para comemorar meu aniversário e preparei tudo para recebê-los no jardim da frente. Dezembro todo mundo sabe como é: festa em todo canto, e como meu aniversário é no dia 14, sempre há dificuldade de juntar gente nesta data ou perto dela. Principalmente nesse ano, pois a minha festa coincidia com o FESTNATAL/Festival de Cinema e o Carnatal. Ao convidar meu vizinho da frente, Mano Macário, nome artístico de Luiz Antonio da Silva, ele disse logo que não podia vir, pois ia sair no bloco das Kengas, no Carnatal.

Mano era – e ainda é – um homem muito bonito. Nessa época, estava usando cerrada barba negra e me disse que ia tirar a barba para a caracterização que usaria no bloco, onde ia fazer “uma mocinha”. “Não seja por isso”, eu falei. “Quando sair do bloco, passe aqui, com o visual de mocinha mesmo, que eu terei prazer em lhe receber. Vou inventar para os convidados que estou esperando uma atriz do Festival de Cinema.” E assim ficamos combinados, as horas passaram, chegou a noite e os convidados começaram a chegar.

Anunciei que estava esperando a atriz Alessandra Stewart, amiga minha, que estava no elenco do filme “Faca de Dois Gumes”. Falei que tinha conhecido ela no Rio há tempos e que tínhamos ficado muito amigas. O nome, obviamente, era inventado e não havia atriz com esse nome no elenco do filme. Uma das minhas amigas disse logo: “Ah, eu sei quem é.” E outra perguntou: “Não é aquela que trabalhou no filme Tal?” e eu: “É essa mesma.” E enfeitei a mentira: “Ela passou um tempo nos Estados Unidos e voltou só pra fazer esse filme.” A primeira amiga comentou: “Ela é linda! Muito boa atriz.” E a outra: “Não é ela que teve um caso com Reginaldo Farias?” E eu: “Essa mesma!”

Essas minhas duas amigas são daquele tipo que sabem de tudo, viram todos os filmes, leram todos os livros e conhecem tudo – você entende, você deve conhecer gente assim. E a festa foi correndo e eu alimentando o suspense: “Alessandra está demorando!” E as outras, ansiosas pra conhecer a celebridade: “Mas ela vem?” E eu: “Vem sim, ela prometeu.”

E lá pras tantas chega no portão Mano Macário, com um minivestido preto de bolas brancas, peruca arrasadora, sem barba, maquiadíssimo, salto alto, uma verdadeira patricinha. Obviamente, via-se que era um homem vestido de mulher, mas irreconhecível até para os seus amigos, acostumados e a vê-lo com a frondosa barba preta. Quando eu o vi, saí aos gritos: “Alessandra Stewart, quanta honra! Entre, querida, pois quero apresentá-las às minhas amigas.” E vou te contar: dinheiro nenhum paga a cara das duas quando viram a presepada.

Foi lindo.

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Alessandra Stewart, Carnatal, cinema brasileiro, Faca de dois gumes, FestNatal, hoax, Kengas, Mano Macário, Memória
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Noite de terror

Clotilde Tavares | 12 de janeiro de 2015

ogrito

Em meados dos anos noventa a Reitoria da UFRN me convocou para acompanhar uns alunos em um projeto. Quarenta e cinco rapazes e moças, de cursos variados, três dias numa cidade pequena para “um experiência de troca com a comunidade”, seja lá o que isso signifique. Minha função era circular pela cidade olhando o que os estudantes estavam fazendo e dando uma força se necessário.

E lá fui eu arrumar a bagagem: colchonete, cobertor, travesseiro, uma toalha, roupas. Como sempre, levei caderno, caneta, um livro pra ler, o celular (que não funcionou – era anos 90), a câmera. Nessa época, eu estudava astrologia e tarô, e levei meu baralho, uma caixa de fósforo e a vela que acendia sempre quando estudava o oráculo. Em um carro da universidade lá fomos nós, Serra do Doutor acima, muito acima de Currais Novos para esse lugar chamado Lagoa Nova, em pleno mês de maio, onde o clima era igualzinho ao da minha Campina Grande, aquela aragemzinha fina, fria, tão gostosa e tão limpa, principalmente com céu azul e sol brilhando. Os quarenta e cinco estudantes descobrindo a América. Dormir no chão, sobre o colchonete de 2 cm de espessura, usar banheiros alagados e unissex, comer gororobas indescritíveis e ensinar ao povo “inculto” o que é certo, o que se deve comer, como lavar as mãos, como se deve educar os filhos e etc. Investigar, pesquisar, aplicar formulários obsoletos desde a década de 1970, quando já eram uma metodologia ultrapassada.

Na primeira noite, os trios elétricos do Carnaval fora de época de Currais Novos, o Carnaxelita, colocam em estado falimentar o fornecimento de energia da região e a escuridão desce sobre a cidade e sobre o alojamento. A noite é chuvosa, sem lua nem estrela, e nada se enxerga, um verdadeiro breu. No banheiro, uma mocinha, nua e ensaboada, grita aterrorizada, tomada de pavor por causa da escuridão. Grita, grita sem parar, uma gritaria assustadora. As amigas informam: “Ela morre de medo do escuro.” Freneticamente, só pelo tato, desarrumo minha mala tão bem organizada para encontrar a vela e o fósforo que iria usar para a leitura do baralho e que é a única vela de todo o alojamento. Acesa, acalma-se o pânico da donzela, que é resgatada do banheiro, pálida e molhada. As amigas deitam-se com ela, colchonetes unidos, e quando a vela acaba trazendo novamente a escuridão, a criatura é tomada de pânico mais uma vez, e recomeça a gritar. E assim vai até que a madrugada trazer a claridade. Com o Sol, a calma desce sobre o alojamento, com estudantes e professora extenuados pela noite de terror. A vida às vezes parece um filme. Pois é.

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Lagoa Nova, medo do escuro, pânico, UFRN
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Dez moedas de ouro

Clotilde Tavares | 28 de julho de 2014

moedas

Essa é uma história acontecida há muito tempo, nas eras medievais. Dizem que um jovem apaixonou-se perdidamente pela bela mulher de um comerciante com o qual ele negociava. A mulher era tão linda que parecia uma santa, e o rapaz ficou encantado com aquele rosto alvo e puro, com aqueles olhos azuis e com a boca delicada, rósea como um botão recém-colhido. O corpo era esguio, flexível e quando ela andava parecia deslizar, flutuando sobre o solo.

Romântico, o jovem compôs logo alguns metros de pura poesia lírica e mandou entregá-las à jovem por um menino de recados, porque acreditava-a virtuosa mas não inacessível, e tinha fé que ela, mesmo casada, se rendesse ao seu amor. Mesmo que houvesse uma certa resistência durante algum tempo, ele confiava na sorte e estava pronto para uma longa e dedicada corte.

Qual não foi sua surpresa quando o menino voltou e lhe avisou que a mulher, assim sem mais nem menos, e sem sequer ler o poema que lhe tinha sido enviado tinha dito que sim, que aceitava, e que se deitaria com ele naquela mesma tarde por dez moedas de ouro!

Vendo o seu ideal cair por terra, e ainda surpreso pelo rumo que as coisas tinham tomado, o rapaz logo se recuperou e começou a pensar em um jeito de castigar a dama pelo caráter interesseiro e mercenário. Pensou, pensou, pensou, e teve uma ideia.

Foi à loja do marido – que era comerciante e conhecido dele, como o meu caro leitor deve estar lembrado – e pediu-lhe dez moedas de ouro emprestadas. De posse do dinheiro, e depois de se certificar que o marido estaria o dia inteiro fora, dirigiu-se até a casa da mulher onde se apresentou, entregou-lhe o dinheiro e observou quando ela guardava as moedas na gaveta de uma mesinha que havia na sala. Em seguida, dedicou-se por toda a tarde às artes amorosas, na cama, no tapete, na varanda, no jardim, e onde mais lhe deu vontade, gozando o ardor da dama, até que se deu por bem pago pelas dez moedas de ouro. Voltou para casa à tardinha, onde banhou-se, jantou e aguardou que a lua se erguesse sobre os telhados da cidade.

Aí, foi novamente à casa da mulher, sendo recebido dessa vez pelo marido, que já havia chegado da loja. Sentou-se, aceitou um copo de vinho e informou ao comerciante que não ia demorar:

– Só passei aqui hoje à noite – disse o jovem – para lhe avisar que não precisei do dinheiro, e como não quis ficar andando por aí com quantia tão elevada, achei melhor passar aqui e deixar com sua esposa. Ela guardou as moedas na gaveta daquela mesinha.

O marido se virou para a esposa que, sem jeito e sem poder negar, mesmo porque o dinheiro ainda estava onde ela havia guardado à tarde, disse-lhe que realmente assim havia sido, e que tinha se esquecido de avisar-lhe.

O moço então se retirou, não sem antes atirar um olhar de desprezo para a mulher gananciosa e baixa que o tinha enganado com sua aparência de santa de altar. Se ela tivesse traído por amor, provavelmente a desculparíamos. Mas como traiu por dinheiro, tanto eu como você, caro leitor, estamos agora mesmo dizendo a mesma palavra: bem feito!

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Moda e geografia

Clotilde Tavares | 31 de maio de 2014

 

Ela pode!

Ela pode!

Eu tenho birra e impaciência com o atendimento em lojas. Não gosto que perguntem meu nome, porque não estou ali para fazer amizade e sim para fazer uma compra, Também me sinto estranha quando uma mocinha que eu nunca vi e provavelmente não vou ver de novo fica me tratando pelo meu primeiro nome, Clotilde-pra-lá, Clotilde-pra-cá. Algumas me chamam até de “Matilde”. Fazer o quê? Trato todo mundo com delicadeza, de Senhor e Senhora, até que a pessoa me dê cabimento. Se não dá, continuo na cerimônia. E gosto de ser tratada do mesmo modo. Mas agora, comprar qualquer coisa numa loja é iniciar um processo de relacionamento com o vendedor, um processo às vezes inusitado. Já falei sobre isto neste blog, aqui e aqui.

Terça feira que passou fui comprar uma sandália. Entro numa dessas franquias de calçados do shopping e a vendedora, por não ter em estoque sandália no meu número, me ofereceu uma bota. Cano longo, segundo ela, ficaria ótima para mim. 

Isso me lançou numa dúvida estética terrível, porque sempre achei que eu, com um metro e cinquenta e sessenta e nove quilos, pernas curtas e grossas, não fico muito bem com uma bota de cano longo. Como recusei, e ela insistiu, aleguei que queria mesmo uma sandália. A gentil vendedora usou então outro argumento. Você já sabe qual: o argumento de que a bota é o calçado mais apropriado para o inverno.

– Mas inverno aqui em Natal? –  pergunto eu.

E ela, didática:

– Bem, “Clotilde”, nós trabalhamos com as coleções de inverno porque nos baseamos nos lançamentos da última moda na Europa, e lá agora é inverno.

Então pirei de vez, caro leitor. Sempre pensei que nessa época fosse primavera na Europa, preparando um verão para o mês de julho, agosto, mais ou menos. Como já cheguei à conclusão de que não entendo de moda, devo estar desatualizada também quanto ao clima e à geografia.

Preciso com urgência me atualizar. Para os assuntos de moda, tenho a minha amiga Gladis Vivane e seu maravilhoso blog Salto Agulha. Mas para Geografia, ainda não sei a quem recorrer. Quem se habilita?

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Domingo de Páscoa

Clotilde Tavares | 31 de março de 2013

Neste domingo de Páscoa, tenho recebido muitas mensagens desejando Feliz Páscoa, às quais agradeço de coração. A Páscoa, como todos sabem, é uma das maiores festas da cristandade, onde se comemora a ressurreição de Cristo. Quando eu era menina, essas histórias soavam meio estranhas na minha cabeça pois a contabilidade não batia bem: se Jesus foi crucificado e morreu na sexta-feira, e ao terceiro dia ressurgiu dos mortos, como é que se comemora a ressurreição no domingo, apenas dois dias depois? Para a minha mente lógica de pequena pentelha de oito anos, algo estaria errado nessa conta, até que aprendi que nesses assuntos de religião a gente não questiona muito não, senão a freira vem e põe você de castigo. Aí, nada de ovos de chocolate.

Pois muito bem: se a festa é para comemorar a ressurreição de Cristo, mesmo considerando dois dias no lugar de três, o que isso tem a ver com ovos e coelhos? Só consegui entender isso depois de adulta, meu caro leitor, e compartilho aqui com você o que andei descobrindo.

É que a Páscoa é uma festa muito mais antiga do que Cristo, muito mais antiga do que a cristandade. Para os povos pagãos, que viveram alguns milhares de anos antes de Cristo, a Páscoa, celebrada no hemisfério norte no equinócio da Primavera – ou nas suas proximidades – celebrava as divindades ligadas à fertilidade do solo. Para estes povos, a fertilidade tinha uma grande importância porque a produção nos campos era a base da vida comunitária, que os permitia enfrentar os dias difíceis e estéreis do Inverno.

Na mitologia céltica e saxônica, por exemplo, celebrava-se nessa época a deusa Eostar, que presidia o nascimento da Primavera e o redespertar da vida na terra. Então ovos eram pintados e enterrados para que fossem encontrados depois pelas crianças, já que o ovo é sinal de uma nova vida que renasce. A lebre, que era o símbolo do renascimento e da ressurreição entre essas culturas, também era o animal sagrado dedicado a Eostar.

Quando a Igreja católica se estabeleceu como instituição, por volta do século III depois de Cristo, as festas pagãs foram cristianizadas, ou seja, sua estrutura e data foram mantidas e deslocou-se a reverência aos deuses pagãos para os fatos da vida de Cristo e dos santos. Isso aconteceu com o Natal, as festas juninas, e tantas outras. O Domingo de Páscoa ainda é determinado pelo calendário lunar, e é o primeiro domingo após a Lua Cheia que coincide ou vem em seguida ao Equinócio da Primavera. Nos países de língua inglesa a palavra Páscoa, em inglês, é Easter, palavra derivada de Eostar.

Então, estão explicados os ovos e os coelhos, e o sentimento de ressurreição, de renovação, que deve passar por todos nós nessa época, independente da religião que professemos. É bom para plantar, para mergulhar as sementes na terra, para visualizar as colheitas futuras que deverão surgir dos grãos plantados hoje.

Abençoada seja esta deusa tão gentil, que recupera do frio solo do Inverno as coloridas flores da Primavera, prometendo os frutos dourados pelo sol do Verão.

——

Eu nunca mais havia escrito nada aqui. Hoje me deu vontade. Quem sabe não me animo e volto a blogar? Pois é.

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coelho da páscoa, domingo de páscoa, equinócio, festa cristã, festa pagã, ovos de chocolate, pascoa, solsticio
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Os sete pecados capitais

Clotilde Tavares | 2 de janeiro de 2012

Hyeronimus Bosch e sua representação dos sete pecados capitais.

Eu nunca tinha lido A Divina Comédia. Já li A Ilíada, A Odisséia, e Os Lusíadas, mas A Divina Comédia nunca. Aí me acontece que por força do ofício e da amizade, aceitei a incumbência de ler um trabalho de um amigo meu justamente sobre A Divina Comédia, com o objetivo de ver se o tal trabalho estava legal, se atendia às normas acadêmicas, essas coisas. Prudentemente, resolvi ler antes a obra, para não incorrer em nenhuma aberração conceitual ou estética, comprometendo assim a minha fama de pessoa culta e bem informada.

Li e achei um barato, mas fiquei muito impressionada com o Inferno. Nunca pensei que tivesse tanto pecado diferente no mundo. Todos os meus terrores de criança interna em colégio de freiras voltaram e eu passei bem umas duas noites sem dormir. E comecei a pensar nessa história de pecado.

No internato, no colégio das freiras, aprendi que existem dois tipos de pecado: os veniais e os mortais. Os veniais são pecadinhos bestas, como estirar a língua quando a professora está de costas ou tomar a cocada da mão do irmão menor. Os pecados mortais não. Esses são perigosos. São aqueles que levam você diretinho para o Inferno, que nos meus pavores de criança era pior, muito pior do que o Inferno de Dante. Hoje não acredito mais em Inferno. Mas acredito nos pecados. Nos pecados mortais. Naqueles que a Igreja chamou de pecados capitais.

Para quem não se lembra mais, os Pecados Capitais são sete. Desses sete, quatro são aqueles que se cometem contra o Espírito e que prejudicam tanto quem os comete quanto a pessoa contra a qual são cometidos. São a Ira, a Cobiça, a Inveja e o Orgulho. E desses, meu filho, Deus me livre. São uns pecados tão feios, tão cabeludos que eu acho que deveria existir mesmo Inferno para trancafiar de vez lá dentro todo mundo que fizesse esse tipo de coisa.

Mas os outros três, ah, meu caro leitor, os outros três são os pecados mais geniais e mais gostosos do mundo. São os pecados que se comete contra o Corpo e, se ofendem alguém, ofendem somente quem os comete. Seu efeito maléfico não se estende a outras pessoas. São a Preguiça, a Gula e a Luxúria.

E eu vou fazer o quê, pobre pecadora que sou dos pecados do corpo? Como o gato Garfield, sou deliciosamente preguiçosa, refinadamente gulosa e gostosamente narcisista, sendo o narcisismo a forma mais elaborada de Luxúria que pode existir.

Fazer o quê? Penitência? Ato de contrição? Ou será que o Inferno me espera, o de Dante e o outro, com seus abismos de fogo e lava prontos para me devorar? O que vocês acham?

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Deixe de pantim!

Clotilde Tavares | 27 de dezembro de 2011

Um dia desses, discutia-se numa das listas que freqüento na Internet sobre o significado das palavras “pantim” e “muganga”. Bráulio Tavares escreveu sobre isso um dia desses no seu blog.

x

Papai e Mamãe

Eu passei minha infância ouvindo as duas palavras, incorporadas no rico dialeto caririzeiro-paraibano que Mamãe falava.

Pantim é difícil de definir. É quando você faz algo para “distrair o inimigo”, ou seja, quando negaceia, disfarça, enrola… Ou quando você falsifica uma ação para obter algo que não quer explicar diretamente. Já muganga é trejeito facial ou corporal, careta.

Voltando ao “pantim”, o diálogo abaixo, travado entre meus pais numa noite, explica melhor:

– Nilo, onde tu tava até uma hora dessa? – Mamãe, direta e nada sutil, atacava com a pergunta.

– Mas minha filha, é somente uma da manhã.

– Sim, mas onde tu tava?

– Você sabe Fulano? – começava papai. – Presidente da Associação Comercial? Pois eu encontrei com ele ontem…

– Não tou falando de ontem, mas de hoje. Onde é que tu tava?

– Espere, eu preciso lhe explicar. Você sabe que em Campina, desde que o prefeito mudou, que todos esses órgãos, como a Associação Comercial, a Federação das Indústrias, a…

Era aí que mamãe interrompia, já impaciente:

– “Ômi”, deixa de pantim e diz logo onde é que tu tava até uma hora dessa!

(…)

Postei esse diálogo na lista para exemplificar o que era o tal do pantim. Aí Leo Sodré, participante da lista, escreveu:

– Mas, onde Nilo estava mesmo? É bem capaz de ter levado Omega nessa farrinha…” (Omega era o avô de Leo, amigo de Papai).

Eu escrevi:

– Nilo devia estar com Omega no cabaré de Zefa Tributino, ou na Unidade Moreninha. Os dois assinavam ponto num ou noutro lugar toda noite.” (As referências são à vida noturna de Campina Grande na década de 1950/60)

Aí Bob Motta, que é poeta, escreveu:

Nilo tava c’á bixiga, (A)
e se sintindo no céu. (B)
Lhe juro, Crotilde, amiga, (A)
foi de beréu in beréu. (B)
Teve lá no Canaríin, (C)
dispôi saiu de finíin, (C)
mode qui num tava só; (X)
duis putêro de Campina, (D)
visitô os das Bunina, (D)
da Prata e Bodocongó… (X)

O poeta Bob Motta.

(Veja o esquema de rimas: o 1º verso rima com o 3º; — o 2º com o 4º; — o 5º com o 6º; — o 7º com o 10º; — e o 8º com o 9º. A estrofe é uma décima que comporta variados esquemas de rima, sendo este citado apenas um deles. A métrica é sete sílabas, redondilha maior, que você reproduz pronunciando em voz alta as palavras “ma-ra-cá, ma-ra-ca-tu”. Além disso, Bob Motta usa a chamada “linguagem matuta”, que consiste em um “português estropiado” – que não é usada nem pelo cantador de viola, nem pelo autor de folhetos de cordel e nem por mim, que procuramos usar sempre o português correto, mas é característica da chamada “poesia matuta”, cujo principal representante foi o poeta Catulo da Paixão Cearense. Forneço essa explicação para que as pessoas entendam como é complexa e rica a arte da poesia popular nordestina.)

Eu, que não deixo verso sem resposta, respondi seguindo o mesmo esquema, mas no calor do improviso deixei escapar a rima da terceira linha.

Nilo não tava sozinho
Na rota da sacanagem
Com o seu amigo Omega
Em total camaradagem
Lá em Zefa Tributino
Beberam uísque do fino
Com Paraguaíta e Nina
E com Chiquinha Dezoito
Pintaram o sete e o oito
Nos cabarés de Campina…

Bob Motta escreveu, repondendo:

Nilo tava de zonzêra,
lá na Ìndios Carirís,
bebeu quage a noite intêra,
no Canaríin, pidiu bis.
Na Unidade Moreninha,
lá nais Bunina intêrinha,
o peste num tava só;
tava prá lá de intêro,
foi in tudo qui é putêro,
da Prata e Bodocongó…

Aí eu fechei:

E quando chegou em casa
Mais pra lá do que pra cá,
Cleuza já tava na brasa
E começou o fuá:
Neguinho, conte direito!
Me conte de todo jeito,
Eu lhe peço mesmo assim!
Onde tu tava, maldito?
Tu acha isso bonito?
Ômi, deixe de pantim!


Este post é dedicado à pesquisadora Maria Alice Amorim, minha especial amiga, cujo trabalho sobre poesia popular está merecendo um post especial somente para ela, coisa que venho devendo há meses.


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Quatro histórias e um samba

Clotilde Tavares | 26 de dezembro de 2011

Pouco antes do Natal, a reportagem do Correio da Paraíba quis saber qual era a obra literária ou musical que eu gostava e que tivesse como tema o Natal. Lembrei logo do conto “O peru de Natal”, de Mário de Andrade, onde o autor desconstrói o sentimento natalino de amor e congraçamento, estabelecendo uma narrativa que parte exatamente do contrário; a vingança. Só que, na contramão do que se poderia esperar, as coisas vão se adoçando ao longo da história e esta se conclui deixando no leitor um sentimento de que, apesar de tudo, as coisas podem ser boas, e que a felicidade é possível.

Aí, eu comecei a me lembrar de outras narrativas sobre o Natal, das histórias engraçadas sobre presentes e pedidos ao Papai Noel – como o do garoto que pediu ao bom velhinho um ônibus de presente, para que a mãe, que precisava andar de ônibus e que sempre pegava o coletivo lotado, pudesse ter um ônibus só dela, para viajar com mais conforto.

Por tabela, e dessa vez sem ter nada a ver com o Natal, lembrei também da história do estudante, filho de milionário dos emirados árabes, estudando em universidade inglesa. O rapaz, acanhado de chegar todo dia na escola em luxuoso Rolls-Royce, falou desse incômodo ao pai, e referiu que todos os colegas iam para a escola de trem. O ricaço não vacilou e comprou um trem para levar o filho à aula.

Voltando ao Natal, há uma história muito meiga. O padre viu que uma garotinha entrava sorrateiramente na igreja e tirava a imagem do Menino Jesus do presépio. Lá fora, surpreendeu a menina colocando a imagem da cestinha da bicicleta nova, e preparando-se para pedalar. “Onde pensa que vai?”, perguntou o padre. Ela respondeu: “Ah, padre, eu rezei muito para o Menino Jesus pedindo uma bicicleta de Natal, e prometi a ele que se ganhasse vinha buscá-lo para dar uma volta…”

Finalmente, nada melhor do que um dos meus sambas preferidos, “Véspera de Natal”, do grande Adoniran Barbosa, onde o poeta narra uma estranha e patética aventura.

“Véspera de Natal”, de Adoniran Barbosa

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Adoniran Barbosa, histórias de Natal, Mario de Andrade, O peru de Natal, Papai Noel, Véspera de Natal
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Vai um torresmo?

Clotilde Tavares | 22 de abril de 2011

Nas Minas Gerais, o torresmo está presente em tudo. Iguaria politica e nutricionalmente incorreta, gordura pura, colesterol em estado de exagero, mantive-me à distância; e muito embora o que excite minha gula são mesmo os doces, não posso negar o apelo irresistível do torresmo, crocante e saboroso, parede ideal para a cerveja como reza a foto.

A manhã hoje foi passada no Mercado Central de Belo Horizonte, vadiando por entre os boxes repletos de todo o tipo de coisa.

Depois, um bacalhau no tradicional Restaurante do Porto, na Espírito Santo com Aimorés, a uma quadra de onde estou hospedada.

Agora é jiboiar um pouco e arrumar as malas para voltar amanhã ao Rio Grande do Norte, para Natal, a Noiva do Sol, minha cidade querida (como gostava de dizer o mestre Câmara Cascudo).

Estou troncha de saudade.

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