Biblioteca em casa
Clotilde Tavares | 1 de agosto de 2009O pessoal mais velho – mais velho mesmo – diz que o maior inimigo das bibliotecas pessoais são as viúvas. O cara junta ao longo da vida, com engenho e arte, uma biblioteca de qualidade e, quando morre, a mulher, passado o sétimo dia, vende os livros aos sebos por qualquer quantia. Isso porque geralmente o homem junta os livros mas cabe a ela mantê-los organizados e limpos, sem poeira, além da extrema aporrinhação de disputar o espaço doméstico com a livralhada que, para algumas mulheres, obstrui qualquer projeto de decoração.
E é o pessoal “mais velho” quem diz isso porque hoje é até politicamente incorreto pensar que só os homens juntam bibliotecas, uma vez que as mulheres são seres pensantes, inteligentes, e que também gostam de ler. Na prática, porém, eu continuo vendo que a maioria das grandes bibliotecas particulares são reunidas por homens e que as mulheres/esposas/viúvas continuam se comportando como aquelas do parágrafo aí em cima.
Lembro da minha mãe que apesar de gostar de ler sempre reclamava da quantidade de livros que havia em casa, os livros do meu pai que depois foram acrescidos aos nossos. Meu pai era charadista, e tinha coleção de dicionários, pra você ter uma idéia. Ainda em vida, ele foi se desfazendo devagarinho de todos os livros, presenteando os amigos, os filhos, e quando faleceu não tinha mais quase nada.
No meu caso, além dos 1.800 que tenho no apartamento, tenho mais uns mil na casa da minha filha – a minha antiga casa, onde ela mora agora. Neste apartamento para onde vou ainda este mês, há uma sala enorme e mais um quarto, um banheiro e a cozinha americana. Ou seja: o núcleo da casa é a sala, onde vou colocar meus livros e viver no meio deles, como eu gosto, olhando suas queridas lombadas.
Atualmente, no apartamento de três quartos em que moro sozinha, meus livros estao confinados em um dos quartos, que denominei “escritório”, e onde pouco permaneço pois sou claustrófoba e prefiro ficar na sala, que é um pouco mais ampla e que se abre sobre a varanda de onde vejo o mundo. Os livros não cabem na sala, ou melhor, caberiam, mas aí eu ia ter que colocar o sofá e as poltronas em outro lugar…
Já estou chamando de “estúdio” a minha nova morada, de apenas cinco cômodos nos seus 80 m2, dos quais a sala ocupa a metade. Vai ser uma grande mudança em relação ao apartamento em que vivo atualmente, de 115m2 distribuído em 12 cômodos dos quais não uso a metade. Neste novo espaço, os livros serão a estrela principal do show.
Esperto foi o Mindlin que já doou parte da sua coleção particular (só uma partezinha de 30 mil volumes) para a USP. 🙂
Quanto a sua sala, depois coloque uma foto pra nos “matar” de inveja!
Tem pior.
E se, além dos livros propriamente ditos, houver uma infinidade (mesmo!) de papéis, cópias, recoretes de revistas, publicações especiais, anotações e gibis – muitos gibis (toda linha DC Comics desde 1984)?
Meus filhotes ainda são pequenos, mas tenho tentado incutir-lhes o prazer da leitura (com um certo sucesso, eu diria)… Quem sabe não consigo que eles perpetuem essa mania?
Ou isso, ou venho “puxar a perna” da Dona Patroa caso ela passe tudo nos cobres quando eu me for… 😉
Abração!
Eu era professor do Instituto de Teologia da Arquidiocese de Fortaleza, até ser demitido por força das brigas internas da Igreja Católica. Tinha então resolvido que parte da minha biblioteca seria doada à biblioteca da Instituição, após a minha morte ou incapacitação (somente parte, porque tem algumas coisas não muito adequadas a uma instituição religiosa…), mas agora voltei à estaca zero quanto à destinação do acervo. O exemplo do seu pai me pareceu muito interessante, mas é preciso que tenhamos consciência da nossa finitude para agirmos assim, pois sempre pensamos como W. Benjamim, que a nossa biblioteca nos perpetuará…