Meu casaco de general
Clotilde Tavares | 8 de janeiro de 2010“… Com minhas calças vermelhas, meu casaco de general, cheio de anéis…” Quem não é muito jovem sabe o que é isso: um trecho da letra de um belíssimo blues de Jards Macalé, popularizado na voz de Gal Costa e repetido à exaustão, de todas as formas possíveis, por todos os freaks que habitaram os anos 70 e 80.
Eu fui uma dessas pessoas. Com algum domínio do violão, afinação e atitude para interpretar, fazia shows gratuitos para delírio da galera principalmente na saudosa Bodega da Praça, em Ponta Negra, na cidade de Natal, onde eu moro desde os anos 1970, com dois intervalos: Recife (1978-1979) e João Pessoa (2005-2009).
O “casaco-de-general” sempre me pareceu uma roupa ritual, algo que se veste para ir à guerra, para ir à luta. Aquela peça de roupa que você tem ali pendurada nas ocasiões em que a empresa é perigosa, você não sabe quando volta, a noite é fria e, por causa da solidão, as possibilidades são imensas.
Eu tive dois desses casacos-de-general. O primeiro, um paletó de veludo cotelê verde-escuro, com bolsos laterais onde eu enfiava as mãos e um bolsinho interno onde ia o dinheiro e a chave. Nas noites de Campina Grande, no final da década de 1960, ele me aquecia e me protegia, qual cota de malha, das batalhas que começavam a aparecer no horizonte dos meus vinte verdes anos. Hoje repousa velhinho, velhinho, no fundo do baú das roupas que tenho pena de jogar fora. Obviamente não me cabe mais.
O outro foi feito a partir de uma camisa da aeronáutica que ganhei de presente no início dos anos 1970, quando fui morar em Natal. Feita de grosso zuarte azul escuro, eu a cortei na altura da cintura, ajustei e transformei numa jaqueta. Preguei umas tachas de metal, bordei umas flores e pronto: virou uniforme. Para onde eu ia, a emblemática peça ia comigo, mostrando quem eu era: freak, neo-hippie, fora-de-moda, outsider. Um dia, no fragor de uma das muitas batalhas noturnas, deixei-a a contragosto no no terreno do inimigo e nunca mais voltei para buscá-la.
Hoje você olha para mim e vê uma senhora muito arrumada, da terceira idade, bem vestida e maquiada. O que você não imagina é que, por dentro, vestindo a minha alma, ainda se encontra meu casaco-de-general, com o qual eu vou seguindo, por todas as ruas, e vou tomar aquele velho navio…
(Marcos Sá é meu amigo, que me emprestou essa foto para ilustrar o post, tipicamente dentro da estética dos anos ’70: o casaco-de-general sobre o macacão Lee, o cabelo black-power e os óculos Ray-Ban modelo aviador.)
Vou fazer um post somente com minha farda escolar dedicado a você, seu vouyeur sem-vergonha!…
Essa foto foi tirada nos degraus da entrada do apartamento do Dr. Tarcísio Maia na Domingos Ferreira em Copacabana por sua filha Ana Silvia (que na época estava fazendo um curso de fotografia e me usou como modelo). Esse casaco foi comprado no “Lixo”, uma loja que vendia roupas usadas por soldados americanos no Vietnan (pelo menos era o que eles garantiam). Esse meu era de um General da Banda azul “natiê” (kkkkkkk) com botões e detalhes em dourado. Era o fraco!!! Não dá para ver mas nos pés vinham uns tamancos holandeses de verniz vermelho. Meu Deus, como eu era exagerado!!!
vc com neo-hippie está uma gracnha… Só faltou a farda escolar para mergulhar na minha memória…
Rárárárá! Esse é o Marcos Sá do Som da Mata? Show de bola a foto. Adoro Vapor Barato, nem me incomodo de O Rappa ter estuprado a música.
Sensacional. Excelente. E a foto do Marcos, supimpa.