Cioran e o domingo
Clotilde Tavares | 13 de setembro de 2009Hoje, com preguiça de ter ideias, abri meu arquivo de frases. É um arquivo que tenho no computador e que me socorre sempre nessas horas em que estou com preguiça de escrever. São frases instigantes, curiosas, inteligentes, que vou juntando até que um dia elas possam servir para alguma coisa.
E para este domingo de preguiça, nada como uma boa sacudidela na felicidade, desafinando o coro dos contentes e atacando de pessimismo com o filósofo Émile Cioran (1911-1995). Cioran nasceu na Romênia, foi para a França com 26 anos e lá permaneceu até à morte, na convicção de que a condição de apátrida seria a melhor possível para um intelectual. Deixou vários escritos filosóficos sobre alienação, absurdo, decadência, tirania e temas semelhantes. Então, para você, neste domingo, alguns dos meus trechos preferidos de Cioran.
“Não existe diferença alguma entre os sonhos de um açougueiro e os de um poeta”.
“É o louco que existe em nós quem nos obriga à aventura. Se nos abandona, estamos perdidos: tudo depende dele, inclusive nossa vida vegetativa; é ele quem nos convida a respirar, quem nos obriga a tal, e é também ele quem empurra o sangue por nossas veias. Se ele se retirassse, ficaríamos sós!bNão se pode ser normal e vivo ao mesmo tempo.”
“Longe de mim o desejo de pervereter tuas esperanças: a vida se encarregará disso.”
“Se eu acreditasse em Deus, minha indiferença não conheceria limites: passearia completamente nu pelas avenidas.”
“Todo solitário é suspeito; um puro não se isola. Para desejar a intimidade de uma cela é preciso ter a consciência pesada, é necessário ter medo dessa consciência.”
“A função dos olhos não é ver, e sim, chorar. E para ver, realmente, é preciso fechá-los: é a condição do êxtase, da única visão reveladora, no momento em que a percepção se esgota no horror do já visto, do irreparravelmente sabido desde sempre.”
“Querer significa manter-se a qualquer preço em estado de exasperação e febre.”
“Tenta ser livre, morrerás de fome. A sociedade só tolera os servis e os déspotas. É uma prisão sem guardas, mas da qual não escapa ninguém sem perecer.”
“O pensamento é uma mentira, como o amor ou a fé. Pois as verdades são fraudes e as paixões odores; e, no fim das contas, a escolha está entre aquele que mente e aquele que fede.”
Finalmente a que mais gosto, e que se aplica muito bem ao dia de hoje:
“A única função do amor é a de ajudar-nos a suportar essas tardes dominicais, cruéis e incomensuráveis, que nos ferem para o resto da semana e para toda a eternidade.”