Escrever: fissura, ofício e prazer
Clotilde Tavares | 5 de agosto de 2009Um dos leitores deste blog me escreve relatando que ouviu uma crítica à minha forma de escrever, e ficou incomodado. Ele ouviu uma pessoa dizer que lamentava que eu escrevesse de modo tão simples, tão corriqueiro. Segundo essa tal pessoa, meus escritos eram medíocres pois não mostravam erudição, não pareciam produzidos por uma pessoa da Universidade (à qual pertenci durante quase mais de trinta anos).
Quero tranqüilizar o meu amigo, pois considero essa opinião um elogio. É exatamente esse o meu objetivo: escrever para que as pessoas entendam a história que estou contando, a opinião que estou defendendo, o ponto de vista que estou querendo demonstrar. E quanto mais gente entender, melhor.
É sempre bom escrever lembrando que a escrita é um processo de comunicação e que esse objetivo, de comunicar algo, que deve vir em primeiro lugar. No entanto, muita gente se deixa seduzir pela vaidade e se esquece disso, colocando em primeiro lugar objetivos pessoais como “fazer bonito”, ser admirado, ser elogiado. Aí, geralmente, o que se vê é uma escrita empolada, pedante, cheia de preciosismos e geralmente incompreensível,.
Para cada tipo de leitor, ou de texto, há uma escrita diferente. A linguagem do blog é um tantinho mais leve e coloquial do que a linguagem das crônicas que escrevo semanalmente para os jornais e quando escrevo para teatro, tenho que ter o leitor – ou melhor, o espectador – sempre presente porque a peça não é literatura; é teatro e tem que prender a atenção do espectador para que ele fique ali sentadinho e assista até o final. Enquanto você pode largar o livro e sair um pouco, tomar um copo de água e depois retomar a leitura, no teatro isso é impossível. Então é preciso pensar sempre no espectador, e na forma de prendê-lo na poltrona sem que ele se entedie.
As crônicas têm endereço certo: o meu “caro leitor”, a quem me dirijo textualmente em algumas delas. A crônica – no meu entender – tem que ser curta, amena, em linguagem simples e deve ter um fecho interessante. Às vezes em vez de crônicas escrevo artigos opinativos, mas procuro seguir o mesmo princípio e sempre usando o humor. O meu “caro leitor” são as pessoas comuns que lêem, ou melhor, passam os olhos no jornal.
Isso não quer dizer que eu não possa ou não saiba escrever do jeito “acadêmico”. Se eu quiser, posso produzir um texto assim. Já escrevi teses, monografias e artigos científicos na época em que me dedicava exclusivamente à produção de conhecimento científico na área específica em que trabalhei por anos. Lembro-me de que uma vez me diverti bastante em um curso que fiz. O professor era daqueles que adorava quem escrevia “difícil” e eu mandava ver, somente para tirar a nota máxima. Alguns trabalhos meus não faziam o menor sentido – eu escrevia assim de propósito – mas o camarada se envolvia com as minhas palavras bonitas e os períodos subordinados em cascata e sempre colocava dez.
Só tem uma hora em que eu não penso no leitor: É quando vem a vontade de escrever como forma de expressar uma inquietude, uma fissura. O texto resultante pode até ficar bom para publicar (geralmente fica), mas isso é apenas um detalhe. O objetivo não é publicar, é me livrar de algo que não pode mais ficar “dentro”.
Nessas situações, gosto de citar Hemingway: “Escrever é fácil. É só sentar na máquina e abrir uma veia.”