Idade Média sem trevas
Clotilde Tavares | 11 de julho de 2023Por que usamos os termos práticas medievais, prisões medievais, etc, em relação a coisas abomináveis, absurdas, atrasadas, reprováveis? Por que dizemos que a Idade Média é a “Idade das Trevas”? De onde saiu isso?
Quando estudamos, vemos que o medievo não é esse período obscuro e atrasado que habita nossa imaginação leiga, alimentada pela ficção cinematográfica e não por um conhecimento com base na ciência historiográfica. O que acontece é que visões negativas se cristalizaram e caíram no senso comum.
Então vejamos.
No século XVIII, surgiu na França o Iluminismo, movimento cultural baseado no racionalismo, feito pela elite intelectual europeia. Esse movimento tentou buscar um rompimento com a mentalidade medieval e acreditava na ideologia do progresso, na Razão, que iria iluminar as mentes das pessoas e expulsar as trevas da superstição e da ignorância que, no entender deles, vinha da Idade Média. Denominaram o século 18 como o Século das Luzes e passaram a chamar, por oposição, a Idade Média de Idade das Trevas. Hoje, essa denominação está sendo abandonada por ser considerada preconceituosa e sem fundamentação histórica.
Os estudiosos consideram que a passagem de uma idade a outra se dá através de uma continuidade, e não uma ruptura. Entre a Idade Média e a Idade Moderna, essa continuidade se deu através de processos lentos e graduais como o Renascimento, o Protestantismo, os Descobrimentos e a Centralização Política. Os elementos desses processos, concretizados na Idade Moderna, já estavam presentes no medievo.
Na Idade Média há o surgimento das corporações mercantis, das guildas de artesãos e comerciantes. Constroem-se de belas e suntuosas igrejas, e acontece também a reconstrução da ordem social a partir dos escombros do império romano. Os idiomas nacionais se consolidam, e surge a civilização ocidental cristã. Não houve trevas, mas a inauguração de um recomeço em uma Europa arrasada pela decadência. A própria democracia ocidental é muito mais de origem medieval do que grega, pois se baseia em esquemas contratuais e representativos nascidos nas monarquias feudais.
É ainda na Idade Média que surgem os governos representativos, o habeas corpus, os bancos, a contabilidade, a escrita musical, a imprensa e as universidades.
Também na Idade Média surgem os romances cantados, objeto do podcast ROMANCEIRO VIVO, em oito episódios, criado e narrado por esta locutora que vos tecla.
É só clicar aqui: https://youtube.com/playlist?list=PL2t2uTCTKKYEYQZVdREcvzctWuhy-Kta3
E a quem interessar possa, tem muito mais em FRANCO JUNIOR, Hilário. O Significado da Idade Média. In: A Idade Média: nascimento do Ocidente. São Paulo, Brasiliense, 1988, p 170-181.
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Este texto foi publicado originalmente no Facebook em 2 de março de 2023 <https://www.facebook.com/clotilde.tavares/>