Ouvindo a intuição
Clotilde Tavares | 23 de outubro de 2009A minha mãe era uma mulher muito sábia. Ela possuía em alto grau essa sabedoria atávica, ancestral, intuitiva, que vem não se sabe de donde, e que não se aprende nas universidades. É uma espécie de dom, algo que parece trazermos inscrito no nosso DNA. Até os meus vinte e dois anos, tempo em que vivi em casa e convivi com Mamãe, aprendi muito, e hoje me considero também depositária dessa sabedoria, exercitada a cada dia, nas situações do cotidiano que me são apresentadas pelo fluir do rio da Vida.
Uma coisa curiosa em Mamãe era que, nos seus atos, obedecia sempre à voz da intuição, que ela chamava “a minha natureza”. Essa “natureza” dela a fazia ter comportamentos ou atitudes inesperadas, quando se recusava a participar de algo ou a gostar ou desgostar de alguém. Os parentes reconheciam esse seu dom e era chamada sempre para resolver conflitos familiares na grande família de dez irmãos da qual fazia parte, sendo a sétima filha. Qualquer problema, qualquer situação de estresse familiar, lá ia ela para Recife – onde morava boa parte dos meus tios e tias. Moças solteiras que engravidavam, rapazes que não queria seguir a carreira determinada pelos pais, casais que ameaçavam se separar, crises financeiras, Mamãe ia, com sua “natureza” a tiracolo, dar um jeito nas coisas.
É, meu caro leitor. A intuição é uma função cerebral tão importante quanto a razão, ou o raciocínio lógico, mas opera diferente, através de caminhos que não conseguimos entender bem. Além disso, a nossa educação, toda firmada em cima de funções lógicas, não dá muito status de saber ao conhecimento intuitivo. No entanto, ele está aí a nosso serviço. É só saber como utilizá-lo, e não reprimi-lo quando ele se manifestar. E, antes que me perguntem: a intuição não tem sexo. Não existe esse negocio de “intuição feminina”. Os homens também a têm, no mesmo grau que nós, mulheres, mas a reprimem de tal forma, e a descaracterizam como “coisa de mulher”, que ela raramente se manifesta entre eles.
No exercício das minhas funções intuitivas, eu dou extrema importância a instintos, a essas mensagens que vêm à mente consciente não se sabe de onde nem por que. Olhei e não gostei, mesmo que não haja nenhum motivo, não me aproximo. “Sinto” que fulano não presta: não faço negócio. Entro no carro e lá vem a voz: “Vá de táxi”. Vou de táxi. Estou de passagem comprada e lá vem a voz de novo: “Não vá não” e eu não vou não. Estou em casa sentada e a voz diz: “Vá”. E eu largo o que estou fazendo e vou.
Foi assim que ontem eu simplesmente desisti de ir à viagem do Cariri, para a qual havia me planejado há dias. Acordei de manhã e a voz disse: “Não vá não!” Disse e repetiu, de maneira tão forte e consistente que eu simplesmente cancelei tudo. Telefonei cancelando a reserva na pousada, cancelei os encontros que havia marcado com os amigos e não fui mesmo.
Aí você me pergunta: “E quem garante que a voz está certa?” Eu, meu caro leitor, eu garanto. A voz é a minha intuição e eu nunca me arrependi de obedecer a ela. É a voz de mamãe, a voz da natureza, da “minha” natureza, sentimento atávico, conhecimento intuitivo, fonte límpida de sabedoria que aí está, à nossa disposição. É só prestar atenção.