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Carlos Drummond de Andrade, "gauche" na vida

Clotilde Tavares | 31 de outubro de 2009
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Há mais de cem anos, num dia 31 de outubro como esse, em 1902, nascia em Itabira, Minas gerais, o poeta Carlos Drummond de Andrade. Não foi somente um mestre na poesia, mas também na crônica e no conto; sua bibliografia é vasta e dispensa comentários pois é ponto pacífico que Drummond é um dos nossos “gênios da raça”.

Ainda consigo evocar a emoção que tive quando li Carlos Drummond de Andrade pela primeira avez. Tinha uns 14 ou 15 anos de idade e li no colégio, ou melhor, o professor de Português leu alguma coisa durante a aula e depois deixou o livro por ali; eu peguei, folheei e li, entre surpresa e maravilhada, alguns poemas.

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Acostumada com sonetos, poemas de Castro Alves e poesia parnasiana, fiquei completamente de bobeira com a vigorosa poesia daquele homem que dizia tudo o que eu queria dizer mas não sabia. Da mesma forma que ele, eu estava “presa à vida e aos meus companheiros” e sentia, mesmo de forma imperfeita, que “o tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes, a vida presente.” A partir daí, o poeta sempre me acompanhou em tudo, oferecendo a melhor forma de descrever e expresar as minhas paixões, as minhas perprlexidades, os meus anseios, numa época em que eu ainda não tinha linguagem própria para traduzir o que ia no meu coração e na minha mente.

Muitas coisas me ensinou a poesia de Drummond. Ensinou-me que “o mundo é grande e cabe na cama e no colchão de amar”, e que o amor é eterno pois “eu te gosto, você me gosta, desde tempos imemoriais”. Aprendi que um retrato na parede pode doer tanto como se a coisa viva, presente e pulsante estivesse de pé, olhando para mi ali no meio da sala, e desde então guardo certos retratos no fundo das minhas gavetas mais profundas, para que não doam, para que não me machuquem.

Junto com o poeta, compadeci-me de José e perguntei-lhe: “E agora, José?” aproveitando também para perguntar a mim mesma “E agora?” E também fiquei ali, como José, “sozinho no escuro, qual bicho do mato, sem teogonia, sem parede nua para se encostar.” Como as filhas, quis saber de “Nossa mãe, o que é aquele vestido, naquele prego?” E perplexa diante do “mundo, mundo, vasto mundo” descobri que não me chamava Raimundo, não era uma rima e muito menos uma solução. Finalmente, fiquei e ainda fico horas mesmerizada diante do desmesurado edifício poético que é “A Máquina do Mundo”.

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Depois de ler Drummond eu, adolescente estranha e esquisita, descobri um termo que me descrevia exatamente: “gauche”. E, como o poeta, entendi que a condição de artista está sempre ligada a essa “gauchice”, se é que posso dizer assim.

Saúdo entao hoje o poeta de “A Flor e a Náusea”, este homem que sentava “no chão da capital do país às cinco horas da tarde” e dizia, sem admitir nenhuma contestação: “Garanto que um flor nasceu.” No dia em que li esses versos pela primeira vez, aprendi uma lição fundamental: que uma flor, mesmo feia, continua sendo uma flor e que, somente por ser flor, pode furar “o asfalto, o tédio, o nojo e o ódio.”

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Eu acredito

Clotilde Tavares | 30 de outubro de 2009
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Ontem andei aqui falando no Céu, em São Pedro, em livraria celestial. Aí as pessoas me mandaram e-mail querendo saber em que eu acredito. Ou seja, o meu caro leitor quer saber se eu acredito em Deus e qual é a minha religião.

Confesso que eu acho essa curiosidade meio abusada, meio descabida, meio fora de propósito porque crença e religião é uma coisa de foro íntimo e não deve interessar a mais ninguém a não ser a nós mesmos. Por outro lado, já me acostumei com essas atitudes do meu leitor, sempre querendo saber mais sobre mim e isso é compreensível uma vez que sou eu mesma que vez por outra lhe dou esse cabimento, confessando aqui, neste espaço público, coisas que deveriam ficar no terreno pessoal. Então vou tentar responder às duas perguntas colocadas no início: se acredito em Deus e qual é a minha religião.

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Antes de responder se acredito em Deus, quero falar sobre outras coisas nas quais acredito com toda a força do meu coração. Acredito que o mundo tem jeito. Acredito que o ser humano é bom, e se vez por outra fica mau e criminoso isso acontece por motivos que a minha pequena mente não consegue entender, porque também acredito que tem uma mente maior dirigindo todo esse movimento que chamamos de Vida, Mundo, ou Eternidade.

Acredito na Natureza, quando o raio fende o céu, o trovão ribomba e as nuvens se despejam sobre nós, numa chuva carregada da energia das estrelas. Acredito na força das asas do beija-flor, que o equilibra no ar enquanto ele sorve tão gulosinho o mel dos hibiscos do jardim.

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Acredito que o nascer do sol é um dos mais belos espetáculos da terra, muito embora eu nem sempre esteja acordada para vê-lo. Mas contemplo seu esplendor ao contrário vendo o pôr-do-sol, principalmente naqueles começos de noite em que o arco prateado da lua nova se desenha no céu, como que retesado e disposto a levar nossa mente através do azul até as estrelas.

Acredito na Música, no Teatro, na Literatura. Acredito na Arte e na Filosofia. Acredito na Ciência e nas Tradições que dão sustentação e essência aos povos e civilizações. Acredito na cultura simples do meu povo, nos cantadores de viola, nas panelas de barro e nos cestos de palha, nas histórias de trancoso e nos cantos das romanceiras. Acredito no brotar das sementes e na sua transformação em espiga, e na canjica e na pamonha que posso fabricar com ela.

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Acredito nas maravilhas da tecnologia, nos prodígios da informática, nas viagens interplanetárias. Acredito em tudo que vejo estampado nos olhos dos meus netos Marcelo e Isabela. Acredito na confiança que meus gatos sentem quando se entregam aos meus carinhos, e me deixam coçar a sua barriga e puxar suas orelhas.

Acredito nos mistérios. Acredito no que está oculto e naquilo que a minha mente não alcança. Acredito que existe uma batalha entre o Bem e o Mal, e que eu procuro, nas atitudes da minha vida, estar alinhada com as forças do Bem, da Justiça e da Verdade.

Acredito em você, meu caro leitor, como ser humano especial e único entre todos. E também acredito em mim e na força que existe quando dois ou mais de nós nos juntamos com um objetivo comum. Estas crenças formam a minha religião e garanto a você que, se Deus existe, está de acordo com elas.

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A biblioteca celestial

Clotilde Tavares | 29 de outubro de 2009
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Biblioteca Nacional - RJ

Hoje, 29 de outubro, é o “Dia Nacional do Livro”, escolhido por ser a data de aniversário da fundação da Biblioteca Nacional, que nasceu com a transferência da Real Biblioteca Portuguesa para o Brasil. O acervo de 60 mil peças, entre livros, manuscritos, mapas, moedas e medalhas ficou no início acomodado nas salas do Hospital da Ordem Terceira do Carmo, no Rio de Janeiro. A data oficial de fundação da Biblioteca é 29 de outubro de 1810, e sobre a aventura que foi a transferência desse acervo há um livro espetacular, A Longa Viagem da Biblioteca dos Reis, de Lilia Maritz Schwarcz, editado pela Companhia das Letras em 2002.

Então, hoje para mim é dia de festa. O aniversário de uma biblioteca, minha gente, que hoje também tem muita coisa disponível em formato digital, quer evento mais importante? Quando estive no Rio de Janeiro no ano passado passei um dia internada naqueles corredores, respirando o ar daquelas paredes cobertas de tesouros e com o coração batendo docemente e mais forte só por estar naquele ambiente sagrado, para mim muito mais significativo do que qualquer templo ou igreja. E lhe garanto: se um dia eu morrer e for para o Céu, a primeira pergunta que faço a São Pedro (pergunta que aprendi a fazer com Diógenes da Cunha Lima) é onde está a biblioteca, onde é a livraria. Se não tiver nem numa coisa nem outra dou meia volta e vou para o Inferno, porque lá pelo menos tem rock and roll…

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Brincadeiras à parte, os apaixonados por livros, como eu, devem imaginar o Céu como uma grande livraria, ou biblioteca, onde seja possível encontrar todos os títulos, todas as coleções completas, sem falar nos jornais, revistas, periódicos, fanzines, e tudo o mais que possa ser impresso, escrito ou desenhado.

As poltronas desse espaço paradisíaco devem ser macias como nuvens e o café forte, quente e perfumado. Na biblioteca do céu será possível encontrar, entre outros, o livro de Aristóteles sobre a comédia, que se supõe que ele escreveu mas que não chegou até nós. E o que dizer das outras peças de Sófocles, que escreveu quase 120 mas só sobreviveram sete? E Ésquilo, autor de mais de 80 textos dos quais também só sete chegaram até os nossos dias? Ao todo, seriam 184 textos teatrais desses dois grandes autores, sem falar nos outros: todos os grandes textos da Antiguidade Clássica que foram destruídos pelo fogo das guerras e pela burrice do fundamentalismo religioso!

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Agatha Cristhie

Todos esses livros estariam lá, lado a lado, como aqueles escritos de antigas civilizações que nunca encontraram decifração e que, no céu, foram pacientemente decifrados pelos estudiosos que, na morada celestial, receberam todas as verbas de pesquisa que lhe foram negadas na Terra. Um livro curioso que sei que será encontrado no Céu é aquele no qual a escritora Agatha Christie relata o que aconteceu durante os onze dias em que ficou desparecida, mistério real nunca revelado e cuja solução ela levou para o túmulo.

Um paraíso feito de livros: quer coisa melhor, meu caro leitor? Sem estresse, sem pressa, desfrutado com extremo prazer, porque nessa livraria divina podemos ler lenta e gostosamente todos os livros que quisermos, já que a Eternidade é o nosso tempo e se estende, infinita, à nossa frente.

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Banheiras

Clotilde Tavares | 28 de outubro de 2009

Ontem à noite, depois de um cheio de stress, fiquei pensando em como seria bom mergulhar numa banheira de espuma… Como não tenho banheira, catei na web essas banheiras que compartilho com você.

Um modelo clássico.

banheira_sala

No aconchego da sala, ao lado da lareira… Encontrei aqui.

banheira-holandesa

Que maravilha! Aqui.

Uma banheira de livros… aqui.

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Outra… aqui.

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Essa com TV nem sei onde encontrei.

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Com salva vidas… aqui.

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Essa é a banheira-café; se você seguir o link, vai ver também a cama-sanduíche.

banheira-sapato

E finalmente a rainha da coleção, essa banheira maravilhosa, incrivelmente fashion-brega, que encontrei aqui, por indicação da jornalista Atalija Lima, a quem agradeço a inspiração deste post.

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Eu e meu duplo

Clotilde Tavares | 27 de outubro de 2009

No tempo em que eu ainda estava na ativa como professora da UFRN, tirei três meses de licença prêmio, à qual eu tinha direito. Os colegas perguntavam: “E então, Clotilde, vai fazer o que com esses três meses de folga? Vai viajar? Vai aproveitar para escrever um livro?” e ficavam chocados quando eu respondia que não ia fazer nada, que ia ficar à toa, que tinha tirado a licença exatamente para isso. “Mas fazer nada como?” perguntavam, como se tivessem esquecido do supremo deleite que é ficar estirada na rede branca armada na varanda, empurrando de leve o pé na parede para desfrutar do balanço suave e do rangido do armador.

Essa incapacidade de relaxar, de entregar-se ao ócio, é uma constante nesses tempos turbulentos e apressados em que vivemos. O cotidiano assume uma velocidade, uma intensidade, uma concentração tal que fica difícil desligar-se disso nos momentos de lazer. Então, para acompanhar o ritmo, busca-se também diversões agitadas, velozes, barulhentas e concentradas. Não se admite mais um lazer onde não haja barulho, agitação e movimento.

Além disso, é importante mostrar-se ativo, sociável, extrovertido. Olha-se com desconfiança as pessoas contemplativas, que amam a solidão, o sossego, o silêncio. Um sujeito que passa o fim de semana lendo em vez de sair para a balada, principalmente se é jovem, é olhado com estranheza pelo grupo, e os amigos dizem: “Precisamos arrancar Fulano de casa, do meio desses livros, e levá-lo para se divertir”, como se os livros não fossem uma diversão tão aceitável como qualquer outra.

Na verdade, as diversões desses dias de hoje são cada vez mais desgastantes pelo tempo que perdemos tentando nos divertir, ou lutando para chegar no local da diversão. São horas perdidas em filas para comprar ingressos, em congestionamentos no caminho para a praia ou enquanto aguardamos uma mesa no nosso restaurante predileto. A diversão termina sendo mais cansativa do que o trabalho, mas é preciso se divertir, é preciso freqüentar, é preciso aparecer nos lugares, é preciso dançar a noite inteira, é preciso ir ao restaurante da moda, à buate do momento. É preciso manter a fama de ativo, participante, sociável.

Ah, meu caro leitor, ficar sozinho exige competência. Dedicar o fim-de-semana a arrumar os armários exige coragem. Entregar-se à leitura, à contemplação, enquanto todos estão na praia ou na balada, exige um espírito forte, disposto a enfrentar críticas de todo tipo. Finalmente, ficar à toa, sem fazer nada, simplesmente, é um suicídio social.

Esquecem-se os baladeiros de que é nos momentos de solidão que pensamos, criamos, questionamos. É nesses momentos que acontece o encontro mais importante, o encontro da gente com a gente mesmo, com o nosso duplo, que nos observa do fundo do espelho, que tem coisas para nos dizer mas precisa de silêncio e de calma para se expressar. Dessa conversa, sempre saímos mais fortes, mais calmos, mais vivos e criativos. Experimente. É um bom programa para qualquer fim de semana.

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Cora Coralina, doceira e poeta

Clotilde Tavares | 26 de outubro de 2009
Igreja da Boa Morte em Goiás Velho.

Igreja da Boa Morte em Goiás Velho.

Já andei por aqui falando de uma visita que fiz a Goiás Velho, a antiga capital do estado de Goiás, um lugar lindo, encantado, cheio de recordações de um tempo antigo, com igrejas, casarões e chafarizes de encher os olhos.

Lá também foi a morada da poeta/doceira Cora Coralina, de quem visitei a casa agora transformada em museu, guardando todos os objetos do dia-a-dia da poeta, como a cadeira onde escrevia, seus tachos de fazer doce, seus livros na estante, seus vestidos.

Pois é com grande prazer que apresento hoje um indispensável complemento dos encantos dessa cidade: o livro  “Cora Coralina, doceira e poeta”. Que livro maravilhoso, meu caro leitor! Uma viagem poético-visual-saborosa em torno do universo de Cora, especialmente da sua atividade à frente do fogão e dos seus tachos de cobre, o que a levou a dizer: ” – Sou mais doceira do que poeta”.

O livro é um edição da Global Editora, em tamanho grande (30×23 cm) capa dura, magnificamente ilustrado por Claudia Scatamacchia e com fotos das receitas por Cristiano Lopes. Tem textos sobre Cora de sua filha Vicencia Bretas Taham, do neto de Cora, o advogado e jornalista Flavio de Almeida Salles Junior, além de texto de J. A. Dias Lopes, jornalista e gourmet.

A Casa Velha da Ponte.

A Casa Velha da Ponte.

Ana Lins dos Guimarães Peixoto, a Cora Coralina, nasceu na cidade de Goiás Velho, mas saiu de lá bem jovem, indo morar em São Paulo. Voltou a Goiás Velho aos 45 anos de idade e, tornando a habitar na casa velha dos seus ancestrais, chamada a Casa Velha da Ponte, começou a fazer doces para sobreviver. Escrever já era hábito desde os 14 anos de idade. Publicou seu primeiro livro com 75 anos e, reconhecida nacionalmente tanto como doceira como quanto poeta, falceceu aos 96 anos, deixando vários livros publicados.

Esta publicação traz suas receitas, apresentando o texto na redação original de Cora e em seguida sua interpretação, com as quantidades, para que eu ou você possamos repeti-las. Isso porque a receita original geralmente é escrita sem as quantidades, ou com quantidades aproximadas, tornando impossível a sua reprodução por uma pessoa com dotes culinários reduzidos, como esta blogueira e quem sabe muitos dos seus leitores.

Cora Coralina.

Cora Coralina.

A viagem é doce, saborosa e cheia de poesia, pois as receitas são entremeadas com fotos da cidade, da casa, e com poemas de Cora. São doces, bolos, pudins, biscoitos, broas, geléias, cremes, licores e vinhos caseiros, todos com fotografias e todos de dar água na boca.

Eu adorei esse livro que a Global editou para celebrar os 120 anos de nascimento desta mulher espetacular, que nos deixou esse legado poético de doces delícias, esse versos cheios de sabor, e o exemplo de sua vida.

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casa velha da ponte, Cora Coralina, Cora Coralina Doceira e Poeta, cozinha goiana, Global Editora, Goiás, Goiás Velho, igreja da boa morte, Vila Boa de Goiás
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Elogio da Preguiça

Clotilde Tavares | 25 de outubro de 2009

Você já ouviu falar de Juvenal Antunes, poeta nascido em 1883 em Ceará Mirim, RN? Ele foi personagem da série “Amazônia” e aqui você sabe mais sobre ele. O que eu queria mesmo era preencher esse domingo com o magnífico poema “Elogio à preguiça”, da sua autoria.

ELOGIO DA PREGUIÇA

Poema de Juvenal Antunes (1883-1941)

Bendita sejas tu, Preguiça amada,
Que não consentes que eu me ocupe em nada!
Mas queiras tu, Preguiça, ou tu não queiras,
Hei de dizer, em versos, quatro asneiras.
Não permuto por toda a humana ciência
Esta minha honestíssima indolência.
Lá está, na Bíblia, esta doutrina sã:
-Não te importes com o dia de amanhã.
Para mim, já é grande sacrifício
Ter de engolir o bolo alimentício.
Ó sábios, dai à luz um novo invento:
A nutrição ser feita pelo vento!
Todo trabalho humano, em que se encerra?
Em na paz, preparar a luta, a guerra!
Dos tratados, e leis, e ordenações,
Zomba a jurisprudência dos canhões!
Juristas, que queimais vossas pestanas,
Tudo que legislais dá em pantanas.
Plantas a terra, lavrador? Trabalhas
Para atiçar o fogo das batalhas…
Cresce o teu filho? É belo? É forte? É louro?
– Mais uma rês votada ao matadouro!…
Pois, se assim é, se os homens são chacais,
Se preferem a guerra à doce paz,
Que arda, depressa, a colossal fogueira
E morra assada a humanidade inteira!
Não seria melhor que toda gente,
Em vez de trabalhar, fosse indolente?
Não seria melhor viver à sorte,
Se o fim de tudo é sempre o nada, a morte?
Queres riquezas, glórias e poder?…
Para que, se amanhã tens de morrer?
Qual mais feliz? O mísero sendeiro,
Sob o chicote e as pragas do cocheiro,
Ou seus antepassados que, selvagens,
Viviam, livremente, nas pastagens?
Do Trabalho por serem tão amigas,
Não sei se são felizes as formigas!
Talvez o sejam mais, vivendo em larvas,
As preguiçosas, pálidas cigarras!
Ó Laura, tu te queixas que eu, farsista,
Ontem faltei, à hora da entrevista,
E, que ingrato, volúvel e traidor,
Troquei o teu amor – por outro amor…
Ou que, receando a fúria marital,
Não quis pular o muro do quintal.
Que me não faças mais essa injustiça!…
Se ontem não fui te ver – foi por preguiça.
Mas, Juvenal, estás a trabalhar!
Larga a caneta e vai dormir… sonhar…

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Elogio da Preguiça, Juvenal Antunes, preguiça
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Inventando histórias

Clotilde Tavares | 24 de outubro de 2009

Trabalhando com teatro, uma das coisas que tenho que fazer de vez em quando é escrever textos que depois serão encenados por atores. Escrever é muito bom, é uma coisa que me dá muito prazer e quando se trata de uma tarefa específica como é o caso dessa as dificuldades que podem aparecer servem apenas como estímulo para tentar alcançar um resultado melhor.

Quando eu ainda ensinava teatro na UFRN muitas vezes inventava personagens a partir dos exercícios de trabalho de ator propostos aos alunos. E o engraçado é que esses personagens, criados pelos alunos/atores eram quase sempre reis, imperadores, sacerdotes, heróis, magos, princesas, governantes… Isso acontece, penso eu, porque projetamos nos personagens que criamos nosos sonhos, nossas expectativas, nossos desejos.

Uma coisa semelhante acontece no que se relaciona à chamada “terapia das vidas passadas”. Segundo alguns estudiosos, é possível acessar existências que já vivemos através de hipnose e outras técnicas. Eu não sei se isso é verdade ou não, e nem quero aqui discutir essa questão. O que quero dizer é, quando se trabalha com esse tipo de prática de uma forma que considero superficial, as pessoas sempre são, em vidas passadas, reis ou imperadores, nobres na corte francesa, sacerdotisas do templo de Ísis, guardiões do tesouro de Persépolis, altos dignatários, embaixadores, e por aí vai.

Aí eu pergunto: e as pessoas comuns? Nunca vi ninguém dizer que, numa vida passada, tenha sido servente de pedreiro ou lavrador. Nunca ouvi ninguém dizer que foi dona de casa ou uma simples costureira, apesar desse tipo de gente – as pessoas simples – representarem noventa e cinco por cento ou mais das pessoas existentes no mundo, em qualquer época que se considere.

Talvez se pense que a vida das pessoas comuns é destituída de atrativos, de aventura, de encanto, mas disso eu discordo. Eu, você, cada um de nós, por simples e comum que seja, tem suas histórias e aventuras para contar. Cada um de nós tem um repositório de histórias, emoções e vivências tão excitantes quanto a vida de qualquer rei, ou rainha. Concorda comigo?

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Ouvindo a intuição

Clotilde Tavares | 23 de outubro de 2009
Cleuza Santa Cruz Tavares, minha mãe.

Cleuza Santa Cruz Tavares, minha mãe.

A minha mãe era uma mulher muito sábia. Ela possuía em alto grau essa sabedoria atávica, ancestral, intuitiva, que vem não se sabe de donde, e que não se aprende nas universidades. É uma espécie de dom, algo que parece trazermos inscrito no nosso DNA. Até os meus vinte e dois anos, tempo em que vivi em casa e convivi com Mamãe, aprendi muito, e hoje me considero também depositária dessa sabedoria, exercitada a cada dia, nas situações do cotidiano que me são apresentadas pelo fluir do rio da Vida.

Uma coisa curiosa em Mamãe era que, nos seus atos, obedecia sempre à voz da intuição, que ela chamava “a minha natureza”. Essa “natureza” dela a fazia ter comportamentos ou atitudes inesperadas, quando se recusava a participar de algo ou a gostar ou desgostar de alguém. Os parentes reconheciam esse seu dom e era chamada sempre para resolver conflitos familiares na grande família de dez irmãos da qual fazia parte, sendo a sétima filha. Qualquer problema, qualquer situação de estresse familiar, lá ia ela para Recife – onde morava boa parte dos meus tios e tias. Moças solteiras que engravidavam, rapazes que não queria seguir a carreira determinada pelos pais, casais que ameaçavam se separar, crises financeiras, Mamãe ia, com sua “natureza” a tiracolo, dar um jeito nas coisas.

É, meu caro leitor. A intuição é uma função cerebral tão importante quanto a razão, ou o raciocínio lógico, mas opera diferente, através de caminhos que não conseguimos entender bem. Além disso, a nossa educação, toda firmada em cima de funções lógicas, não dá muito status de saber ao conhecimento intuitivo. No entanto, ele está aí a nosso serviço. É só saber como utilizá-lo, e não reprimi-lo quando ele se manifestar. E, antes que me perguntem: a intuição não tem sexo. Não existe esse negocio de “intuição feminina”. Os homens também a têm, no mesmo grau que nós, mulheres, mas a reprimem de tal forma, e a descaracterizam como “coisa de mulher”, que ela raramente se manifesta entre eles.

No exercício das minhas funções intuitivas, eu dou extrema importância a instintos, a essas mensagens que vêm à mente consciente não se sabe de onde nem por que. Olhei e não gostei, mesmo que não haja nenhum motivo, não me aproximo. “Sinto” que fulano não presta: não faço negócio. Entro no carro e lá vem a voz: “Vá de táxi”. Vou de táxi. Estou de passagem comprada e lá vem a voz de novo: “Não vá não” e eu não vou não. Estou em casa sentada e a voz diz: “Vá”. E eu largo o que estou fazendo e vou.

Foi assim que ontem eu simplesmente desisti de ir à viagem do Cariri, para a qual havia me planejado há dias. Acordei de manhã e a voz disse: “Não vá não!” Disse e repetiu, de maneira tão forte e consistente que eu simplesmente cancelei tudo. Telefonei cancelando a reserva na pousada, cancelei os encontros que havia marcado com os amigos e não fui mesmo.

Aí você me pergunta: “E quem garante que a voz está certa?” Eu, meu caro leitor, eu garanto. A voz é a minha intuição e eu nunca me arrependi de obedecer a ela. É a voz de mamãe, a voz da natureza, da “minha” natureza, sentimento atávico, conhecimento intuitivo, fonte límpida de sabedoria que aí está, à nossa disposição. É só prestar atenção.

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Paraíso aberto

Clotilde Tavares | 22 de outubro de 2009

Há uma música que fala sobre o Cariri, que diz assim:

“No meu Cariri, pode-se ver de perto

tanta boniteza,

pois a Natureza

é um paraíso aberto…”

Pois é para esse paraíso aberto que estou indo hoje, meu caro leitor, passar quatro dias no Encontro dos Povos do Cariri, um evento que congrega arte, cultura, economia e negócios, e que acontece em São João do Cariri, na Paraíba.

Eu sempre fico feliz de poder voltar a essa região, sobre a qual já escrevi outras vezes aqui neste blog. O Cariri é o berço dos meus antepassados mais próximos, e é lá que fica Coxixola, onde nasceu minha mãe.

Neste final de semana vou encontrar amigos, escritores e artistas, gente da minha gente, povo do meu povo, e vou fazer o lançamento virtual do meu folheto de cordel Cariri de A a Z, onde eu louvo as belezas daquela região. para o meu caro leitor de todo dia nesse blog, faço uma gentileza especial: é suficiente clicar aqui e ler o folheto, disponível para você em formato PDF.

Mesmo viajando, o blog continuará sendo atualizado diariamente mas talvez haja uma pequena demora na liberação dos comentários e nas respostas aos emails. Segunda, 26, tudo volta ao normal.

No mais, é me desejar boa viagem e prometo que quando chegar venho cheia de novidades pra você.

"Sobrado dos Árabes" - São João do Cariri, Paraíba.

"Sobrado dos Árabes" - São João do Cariri, Paraíba.

UPDATE: Minha gente, desisti da viagem. Acordei assim com um pressentimento, uma sensação estranha, e como obedeço muito às minhas intuições, cancelei tudo. É isso. (Escrito às 7h20 da manhã de 22/10)

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